Ensaio
(dedicado a todos os Cavalcanti, no Brasil e
na
Itália, que trabalham
com a palavra)
Guido Cavalcanti: cavaleiro, político e
poeta do sec.XIII
Suas maiores influências culturais
- o trovador Sordello,
- os “Fideli dÁmore”
- Averrois
e Avicena
Afirma o
historiador Alain Demurger:
“Ao longo da Idade Media a cavalaria havia se
tornado a principal arma dos exércitos, e o cavaleiro - o modelo de combatente.
A palavra “miles” (milites plural) designava isso.
A palavra
“miles’, embora mantendo o sentido técnico daquele que combate à cavalo, passou
a designar também a elite dos combatentes a cavalo” (1).
Este sentido de
valor que a cavalaria adquire, ao se tornar a força de elite cristã dos francos
com o vitorioso Carlo Magno no século VIII (2), estará alguns séculos mais
tarde intimamente ligado à “ética do amor cortês” que acaba por se se
desenvolver nas cortes da Aquitânea e do sul da França. Nestas regiões o termo
cortezia, derivado de “court” (corte), designa o conjunto de qualidades do cavaleiro
nobre, presente já na poesia provençal do século XII. Assim
sendo, a cavalaria e noção de cortezia “répresente,
indissolublement liés, un fait social et un fait littéraire” (3) .
Na França, onde se falava a “langue
d'oc”, floresce nas cortes da Aquitânia e da Provença uma poesia de amor
extremamente requintada quanto ao sentimento e quanto à técnica. Essa poesia
dos trovadores difundiu-se a partir do sec. XII pela Europa e veio a
influenciar, profundamente, a poesia ibérica e italiana.
A corte onde nasceu Leonor da
Aquitania (1122-1204) teria sido a mais culta do seu tempo.
O seu avô, o duque Guilherme IX (1071 – 1126), duque da
Aquitânia e conde da Provença, cavaleiro cruzado não muito brilhante mas de
quem conhecemos os mais antigos poemas trovadorescos, foi homem extremamente
culto e transmitiu o gosto pela aprendizagem ao seu herdeiro Guilherme X. Este,
por sua vez, ofereceu uma educação excepcional às suas duas filhas: Leonor e
Petronilha teriam falado cerca de oito línguas e aprendido matemática,
astronomia e com doutores da Igreja, filosofia. Esta educação excepcional para
mulheres na época demonstra a valorização feminina nesta corte. O trovadorismo
teria começado com Guilherme IX, mas teria alcançado sua plenitude com três
poetas cavaleiros e trovadores que escreveram no final deste século, e talvez
não coincidentemente haviam vivido na região do Limousin, próximo de Périgord: Bertran de Born, Arnaud Daniel e Guiraut de Bornelh (4).
Mas a repressão da Igreja aos cátaros como heréticos, a chamada Cruzada
Albigense, havia varrido o Languedoc, sul da França, em campanhas sucessivas de
1209 até 1256, época aproximada do nascimento do notável poeta Guido Cavalcanti.
Formado numa família de cavaleiros cristãos
há gerações apoiadora do papado, florentina e agora “guelfa” (5), Guido
Cavalcanti (c.1255-1300) (6) sabemos foi educado na poesia clássica latina (7),
também da poesia siciliana da sua época (8), sobretudo influenciado pelos
trovadores provençais que refletiam esta situação política de repressão religiosa
à heresia dos cátaros (9).
Neste
contexto Guido Cavalcanti desde muito cedo sofreu a influencia peculiar e decisiva
do trovador Sordello da Goito, cavaleiro lombardo de ideais cortezes que viveu
muitos anos no sul da França e escreveu em provençal.
Guido Cavalcanti, a que tudo indica, foi profunda
e em especial influenciado pela poesia de Sordello cujos ideais cavalheirescos
incluíam, aparentemente, um forte conteúdo crítico social e político.
O pai de Guido, o garboso
cavaleiro Cavalcante Cavalcanti, era de influente família de soldados-cavaleiros,
já ricos mercadores e banqueiros na Toscana neste século. Como garboso
combatente “guelfo”, Cavalcante Cavalcanti com outros parentes participara da
cruel sangrenta batalha de Montaperti por Florença e contra a cidade
“guibelina” de Siena, em 1260 (10). Vencido, saira possivelmente com
dificuldade econômicas do episódio.
Os estragos dos vitoriosos inimigos “guibelinos”
sobre os “guelfos” nesta ocasião foram enormes: uma centena de palácios,
centenas de casas, torres e defesas florentinas destruídas (11).
Poucos anos depois desta derrota
política da sua família, o ainda muito jovem Guido Cavalcanti teria convivido com
a antiga amante do trovador Sordello, Cunizza da Romano, quando ela já uma
senhora esteve abrigada na casa de seu pai em 1265.
Mas, no ano
seguinte de 1266, numa reviravolta político-militar, Florença seria ocupada pelas
forças militares do francês Carlos d´Anjou a pedido do papa, ainda com o auxilio dos próprios banqueiros florentinos
“guelfos”. Os d´Anjou agora afastaram os “guibelinos” do poder e, por sua vez, punem severamente
os vencidos com decapitações e razia de suas casas.
Infância
- Sordello
Neste
período, portanto, bastante difícil de Florença e possivelmente da infância de
Guido, Cunizza da Romano, filha de Ezzelino II, senhor de Treviso, teve a
oportunidade de influenciar favoravelmente a formação poética do muito jovem rapaz,
acreditamos com uns onze anos, ao apresentar-lhe a obra de seu ex-companheiro Sordello
que de forma inovadora escrevia em provençal e não em latim, enquanto acompanhavam
as façanhas militares deste cavaleiro e trovador (12).
Guido, com entusiasmo,
muito cedo teria podido apreciar na intimidade familiar as poesias deste cavaleiro
de origem lombarda, que parece marcar indelevelmente sua personalidade, sua
visão política e literária.
O póprio noivado de Guido, oficializado
por esta ocasião, ele ainda quase uma criança com a filha do guibelino ex-inimigo
de se pai, Farinata degli Uperti, demonstra também o nível de participação
política que dele se esperava, na verdade um noivado que visava mesmo à pacificação
da cidade (1267) (13).
Alguns
anos depois, Guido será o apresentador da obra de Sordello ao seu jovem amigo e
poeta Dante Alighieri, uns dez anos mais novo do que ele (1265-1332), de quem ele
teria sido, mesmo, o mentor. Guido teria introduzido Dante na poesia de
Sordello, incentivando o amigo no uso também da linguagem popular toscana e não
do latim, uma inovação literária para a época.
O poeta Pound, grande estudioso da obra
de Guido como poeta, seu tradutor, chega a afirmar que Guido será a matriz
mesmo na qual o próprio pensamento de Dante se forma (14). E a critica
literária Barbara Raynolds, recentemente, vai mais além: “Dante became his
protégé and responded to his guidance as a poet” (15).
Talvez a admiração de Guido por
Sordello, que escrevia em linguagem popular, explique seu pouco entusiasmo pelo
poeta clássico Virgílio, fato que Dante vai observar na Comédia anos mais tarde
(16).
De Sodello vem certamente a critica à
ganância dos governantes que Cavalcanti teria transmitido depois a Dante (17).
Cunizza da Romano (c.1198- depois de
1279) havia mantido relação amorosa com Sordello, trovador da sua corte, e por
ele havia deixado seu marido, o Senhor de Verona, voltando depois para a
companhia da família materna - uma paixão com muitos envolvimentos ideológicos
e políticos - “guibelinos” e “guelfos”.
Sordello, incompatibilizado com o ex-
marido de Cunizza, fugiu para a Provença e aí se colocou como cavaleiro a
serviço de Carlos d´Anjou na campanha de Nápoles, onde teria sido feito
prisioneiro em 1266 (18). Carlos d´Anjou, irmão do rei francês, como já
observamos havia sido simpático ao partido “guelfo” e aliado dos Cavalcanti em Florença
(19).
Sordello, muito honrado pelos d´Anjou, teria
morrido depois de 1269 na Provence, possivelmente assassinado (20).
Recordemos Sordello nas palavras da crítica
literária Bárbara Reynolds:
“Sordello, o poeta, nasceu em Goito, perto de Mântua, por volta de
1200, mas passou a maior parte de sua vida na Provença. Cerca de quarenta de
seus poemas ainda subsistem, todos em provençal. Dante fala dele de forma
admirável em “De vulgari Eloqüência”, como sendo distinto por sua eloquência,
tanto na poesia como em outros escritos, deixando aparente que tinha lido
certas obras em prosa de Sordello que não foram preservadas. Um poema em
especial, é ainda conhecido como “O Lamento de Blacatz”, uma denúncia dos principais
príncipes da Europa” (21).
Barbara
Reynolds nos lembra que Dante, ao apresentar Sordello na “Comédia” confraternizando
com Virgilio, também um mantuano, começa a referir-se nesta ocasião em alto e
bom som aos desgovernos que fizeram de Florença, (“minha Florença!”) o tumulto
em que ela se encontrava no ano 1300, denunciando em alta voz os imperadores
irresponsáveis e até mesmo os governos florentinos por ilegalidades e mudanças
de legislação.
Algumas fontes
enciclopédicas afirmam que este lamento de Dante tem paralelismo com o citado “Lamento
de Blancaz” de Sordello (1237), em que o próprio Príncipe da Cristandade é
convidado até mesmo a pisar o coração do herói questionador.
Em 1840, o
poeta inglês Robert Browning publicou também um poema, “Sordello”, em que
sugere uma opção politicamente consciente
do trovador. Neste poema, Sordello é dado como de origem “guibelina”, defensor
da forças do Sacro Império, mas que teria feito então a opção de apoiar o
papado como guelfo, entendendo este mal como um mal menor para as pessoas
comuns, e discutindo esta sua opção com sua amante, a persongem “Palma” (22).
O critico
literário Peter Makin, sugerindo o papel relevante de Cunizza nesta opção de Sordello
chegou a afirmar recentemente. “Sorello
was the last great representative of the troubadour culture, and Cunizza had
formed his genius”. (23)
Cunizza da
Romano teria tido, depois de Sordello, ainda vários amores e maridos.
Quando esteve
hospedada na casa do pai de Guido em 1266, aí libertou seus escravos em ato
notarial. Já idosa avizinhara-se da fé (24) e, em 1279, permanecendo na Rocca
de Cerbaia da família de sua mãe Adelaide degli Alberti, legou seus bens ao próprio filho
do conde Alezzandro Alberti (25).
Dante, reiterando esta admiração de
Guido, colocará Cunizza como grande amorosa no “Céu de Vênus” do seu Paraizo,
(Canto IX, 13–65), e ao nos apresentar Sordello na “Comédia”, com certeza honra
e de forma indireta também Guido (Canto Purgatório VI, 61-66).
Sugere-se que Cunizza tenha
descrito Sordello para o jovem Guido, com olhar altivo de leão atento ao
conhecê-la, imagem que Guido teria transferido a Dante (26).
...o
anima lombarda,
come ti stavi altera e disdegnosa
e nel mover degli occhi onesta e tarda!
Ella non dicea alcuna cosa,
ma lasciavane gir, solo
sguardando
a guisa di leon quando si posa.
Ó,
alma lombarda
altiva e orgulhosa,
no mover dos olhos
honesta e vagarosa!
Não nos dizia muito,
permanecia a espreita
leão atento, aguardando
a
presa (27).
Neste caso sugerimos que, com sua admiração pelo lombardo Sordello, Guido
poderia na verdade pretender honrar os próprios lombardos vencidos, já então
também seus antepassados num laço de congraçamento feminino com a família Guidi,
da qual ele mesmo teve o prenome. (28) (29).
Adolescência
– Fideli d´Amore
Mas o jovem Guido
terá ainda outras influências determinantes, além daquelas muito juvenis incentivadas
por Cunizza da Romano.
Já numa fase adolescente,
Guido desenvolverá certamente suas habilidades de cavaleiro, como seu pai e toda
a longa tradição de sua família, bem treinado na arte militar.
As cores e as
insígnias das vestimentas dos Cavaleiros Cavalcanti no confronto militar de
Montperti, em que o pai de Guido tomara parte, chamaram m mesmo nossa atenção:
o vermelho e branco, acompanhadas por brasão emblemado por cruzetas
recruzetadas, cruzetas semelhantes às da Ordem religiosa militar do Templários
(30).
Guido, como membro da família Cavalcanti, família
relativamente recente na Toscana mas de tradição “guelfa”, apoiadora do papado,
cavaleiro com a melhor formação militar e ética, com certeza por suas cores
branco e vermelho e suas insígnias, cruzes semelhantes às dos Templários, tenha
se identificado com o ideário desta Ordem religiosa, tão presente também na
Toscana (31).
Realmente, a critica literária moderna chega
a confirmar realmente esta aproximação entre trovadores, fiéis cátaros e a Ordem
religiosa dos Templários (32). Assim
sendo Guido Cavalcanti teria pertencido em Florença a um grupo leigo da Ordem,
ao grupo dos “Fideis d`Amore”, que se colocavam contra a ganância dos
governantes, tidos como herdeiros do amor cortez e do erotismo cavaleresco.
Desde grupo
teriam participado também Brunetto Latini, Dante, Gino de Pistoia, Lapo Gianni,
Forese Donati (33) (34).
A moderna
estudiosa acadêmica de Cambridge, Bárbara Reynolds, tranquilamente admite e
aceita a participação de Guido, e depois também ainda a inclusão de Dante, neste
grupo dos “Fideis d´Amore” (35).
Já o estudioso
de religiões e simbologia francês, René Guénon (1886-1951), havia se referido ao
trabalho de Luigi Valli sobre os Fideli d´Amore, “Il linguajo secreto di Dante
e dei Fideli d´Amore”. Valli havia desenvolvido com muitos argumentos que, desde
Guido Cavalcanti, seu amigo Dante Alighieri e contemporâneos, até Boccaccio e
Petrarca, a “Dama” como objeto de entusiasmo e devoção seria apenas um
simbolismo e representaria, na verdade, a Inteligência transcendente - a
Sabedoria Divina (36).
Sabemos pela
historia da literatura que Dante, em 1283, com uns dezoito anos, submeteu um
poema aos companheiros de Guido Cavalcanti, ansiando pertencer a este grupo de
jovens poetas. Neste poema Dante contava um sonho que tivera com uma “Dama” que
devorara seu coração (Vita Nova, soneto I, “a toda alma gentil presa de amor”).
Guido
Cavalcanti, bem mais velho, possivelmente já com uns vinte e oito anos, além de
entender seu sonho, algo obscuro e aterrorizador, e responder com seriedade em
poesia (Rime, poema XXXVIII), foi mesmo compreensivo e elogioso com o jovem
poeta Dante, que apenas nele encontrou entendimento verdadeiro por estes versos:
Vedeste ao mio parere, omne valore
e tutto gioco e quanto bene om sente,
se foste in prova del segnor valente
she segnoreggia il mondo de l´onore...
(em tradução adaptada pela autora).
“ viste , segundo penso, todo valor,
a alegria e o bem que um homem sente,
posto à prova pelo senhor valente,
que governa o mundo da honra” (37).
Se
Guido, pelo menos até 1283, pertenceu ao grupo dos “Fideis d´Amore” não podemos
deixar, entretanto, de lembrar suas influencias mais radicais e importantes que,
possivelmente, se insinuaram a partir do começo de sua maturidade.
Maturidade
– a Filosofia
Nesta fase, entrando para a maturidade, Guido
foi descrito por seus companheiros poetas - descrições recolhidas pela história
literária - como de bela aparência, dotado de todas as qualidades, ainda ousadia
e nobreza de alma (38).
O jovem Cavalcanti havia estudado Filosofia
e Retórica (39), e se tornando um jovem introspectivo, porém audaz, algo
distante mas cortez, apreciador de filosofia, com leveza (40).
Bocaccio, em conto muito sugestivo de seu
“Decameron”, nos apresenta metaforicamente o jovem Guido como “sdegnoso”, por
nós interpretado em seu sentido positivo como “altivo” ou “indignado”, mas
sobretudo em sua obra capaz de ser profundamente filosófico, de forma ágil e
muito leve (41).
Seu casamento tratado na infância por
motivos políticos com Beatriz, a filha de chefe
dos guibelinos Farinata degli Uperti – de família tão dolorosamente vencida -
teria sido infeliz, o que indica a busca de Guido mais tarde por outros amores
(42).
Com pendor para a reflexão filosófica, Guido
foi certamente atraído pela influência precursora do pensamento árabe de Averrois
e de Avicenas que então se propagava pela Europa e também na Universidade de
Bolonha, assíduo leitor de Alberto Magno (43).
Averrois (Ibn-Rosch), (1126-1198), foi filósofo
árabe que vivera no século anterior em Córdoba, comentarista e interprete de
Aristóteles utilizando antigas e extraviadas versões árabes. Reintroduzindo o
materialismo de Aristóteles na Europa religiosa, Averrois trazia de volta o
interesse antigo pelo realismo e o sensível. Averrois, trazia de volta a filosofia antiga e afirmava a subordinação da religião à
filosofia quando as argumentações de ambas fossem conflitantes, considerando a
religião como uma filosofia simbólica (44).
Assim sendo, entendemos que o averroísmo não
foi um pensamento religioso ou herético, mas apenas um pensamento filosófico divergente
para a época, bem como o próprio ateísmo questionador característico do próprio
pai de Guido, o cavaleiro Cavalcante Cavalcanti (45).
E Avicena autor de “Líber Canonis”, um
tratado de Medicina muito estudado na época, na Universidade de Bolonha, é até
hoje ainda muito respeitado por suas observações médicas (46).
Como já pudemos notar, Guido gozava em
sua vida familiar de rico ambiente intelectual, pleno de influências culturais
e filosóficas, ambiente do qual certamente participou seu parente, o religioso
Adobrandino Cavalcanti (1217-1279). Adobrandino Cavalcanti no ano de 1273 chegou
a plenipotenciário e substituto do papa Gregório X em Roma (47).
No
momento da morte de Aldobrandino, em 1279, Guido seria já um jovem adulto de
vinte e quatro ou vinte e cinco anos e Aldobrandino pode ter sido, como parente
experiente e prestigiado, um dos favorecedores de sua aproximação com o pensamento
de Aristóteles e dos filósofos árabes.
Pois sabemos
hoje, Aldobrandino foi o difusor e provavelmente mesmo co-participante na obra
do grande filosofo escolático S. Tomas de Aquino (1225-1274) - religioso
dominicano, que utilizando a obra de Averrois possibilitou a aceitação de Aristóteles
no Ocidente, fazendo emergir o homem racional com livre escolha, responsável e
crítico da ambição do ganho e da cobrança de juros (48) (49).
Outro filósofo, de quem já sabemos Guido
era leitor, Alberto Magno (1206? -1280), foi religioso dominicano que lecionou primeiramente
na Universidade de Paris, onde o pensamento de Averrois foi influente e, depois,
em Colônia. Alberto Magno procurou apreender o pensamento de Aristóteles e leu os
escritos dos filósofos Avicena e Averrois para desenvolver suas idéias pessoais
em filosofia. Em Paris fora o professor de Tomas de Aquino (50).
O
próprio Averrois fora autor de uma vasta obra, desenvolvida em vários ramos.
Como leitor dedicado e interprete do materialismo de Aristóteles, Averrois foi muito
prolífico, escrevendo comentários sobre quase todos os campos de investigação
sobre os quais Aristóteles havia refletido – astronomia, medicina, biologia,
ética, lógica, comentários de grande influência para os europeus da época.
Averrois reintroduziu, portanto, o
aristotelismo no Ocidente, a reflexão sobre a realidade concreta e sensível. E seu "averroísmo" tão ligado ao
realismo de Aristóteles, não podendo ser absolutamente ignorado, tornou-se mesmo
o centro de curiosidade nos círculos intelectuais de Paris, Nápoles e Oxford, sendo
depois, muito citado por Tomás de Aquino.
Averrois ao
fim da vida, entretanto, foi perseguido não só pelo califa por suas ideias, mas
também seus discípulos tidos depois como heréticos na Europa (51).
Críticos e
poetas modernos confirmam esta decidida influência de Averrois e do
aristotelismo sobre a obra poética de Guido Cavalcanti, fato que marca de forma
inédita sua lírica e sua extrema modernidade:
Bruno Nardi, em
“Noterella Polemica sobre Averroismo de Guido Cavalcanti”, de 1954 - Ed. da
Universidade de Roma, já observava esta influência de Averrois no pensamento de
Guido Cavalcanti.
O historiador
John Najemy, recentemente confirma as tendências averroistas ou aristotélicas
de Guido, sugerindo ele pertencer talvez a alguma seita ou heteroxia cultural (52).
Mas a critica
literária Bárbara Reynolds, sem querer polemizar, confirma atualmente a influência decidida de Averrois sobre Guido
Cavalacanti, influência de termos da fisiologia e da psicologia que acabam por lhe permitir mesmo criar um novo
vocabulário, termos que depois Dante tomou emprestado (53).
Nosso poeta Haroldo
de Campos, já em trabalho de 1998 (54) baseado em Nardi, afirma ser Guido
Cavalcanti um poeta “heterodoxo com tinturas averroístas”. Seu averroísmo é
referido com ênfase por Humberto de Campos em, pelo menos, mais dois trechos de
seu trabalho. Citamos:
“De Cavalcanti
vem o traço pessimista e amargo de tantas composições dantescas do período
(traço que Bruno Nardi filia ao averroísmo fisiológico da concepção
cavalcantiana do amor)”. Ainda: “... o
dolce stil nuovo, marcando-se, alternativamente, pela influência do “stinozzo’’
(agastadiço, temperamental) e melancólico Cavalcanti (o poeta do splin toscano)
dado por averroismo e epicúreo (vale dizer, ateu, ou pelo menos descrente da
imortalidade da alma)...” (55).
Bárbara Raynolds repara que a poesia
amorosa de Guido expressaria “um conflito entre o idealismo e o desejo, que
resultaria em mais tormento que alegria” (56).
O extremamente leve adjetivo “sbigotite”,
“isbigotite” (significando aturdido, atônito,
tonto) e derivados são com frequência usados por Guido para descrever os seus
estados de ânimo, estados que repercutiriam em seu corpo. Tanto que Simon Westem
seu recente trabalho de 2009 (57) chama atenção para este fato e classifica
vários dos poemas de Guido como de “Amor como Sbigottimento” (58).
Também
em trabalho muito recente, de abordagem bastante aprofundada e filosófica, a
critica literária Frederica Anichi em Voices of the Body, liminal grammar in
Guido Cavalcanti´s Rime (59), seguindo as
pistas do trabalho maduro de Maria Luíza Ardizzone sobre Guido Cavalcanti e o
averroismo (60), identifica ainda traços nítidos
do manual de medicina de Avicenas, o “Líber Canonis” nas metáforas de Guido, efeitos
dos estados d´alma incorporados nas coisas e no próprio corpo, chegando ela a
afirmar que o uso de material da filosofia natural e da medicina por Guido, em
sua poesia, constitue mesmo o caminho de um “saber alternativo” (61).
Em
trabalho anterior Aniche afirmara ainda: “Tradotto in latino da Gerardo da
Cremona, il Cânon [de Avicena] diventa oggetto privilegiadto dei commentari del
circolo di Tadeo Alderotti attivo nela Facoltà di medicina dello Estudio
bolognese, in cui eccelleva Dino del Garbo, uno tra i primi a dedicarsi ao
aommento in latino sistemático del manuale avidenniano...” (62).
Lembramos que Dino del Garbo, jovem contemporâneo
de Guido, foi um dos primeiros autores a fazer comentários à poesia de Guido “Donna
me prega” (63). E Tadeo Alderotti foi um físico desta mesma Universidade que, segundo
ainda Ardizzone teria introduzido Guido Cavalcanti, por suas metáforas do “diáfano”,
na teoria da ótica, atravez Averrois e provavelmente Alhazen (965-1040), (64) físico árabe e matemático
que observou, depois de Ptolomeu, os fenômenos de refração da luz.
Assim sendo a crítica literária Andréa
Sauderson, em recente tese de mestrado para a Universidade de McGill, Montreal,
repetindo as colocações de Frederica Aniche sobre as metáforas avicenianas de
Guido, chega a afirmar:
“O
fenômeno fisiológico das emoções é a chave para a poesia de Cavalcanti. O corpo
é o ponto de partida de Cavalcanti, para a teoria que ele expressa e o léxico
que ele usa” (65).
Citamos o trecho a seguir do levíssimo poema de Guido, exemplo
do afirmado:
Noi siàn le triste penne isbigotite
le cesoiuzze e ´l coltelin
dolente,
ch´avemo scrittie dolorosamente
quelle parole che vo´avete udite
or vi dicián perche noi sian partite
e siàn venute a voi qui di
presente:
la man che ci move dice che sente
cose dubbiose nel core aparite;
|
Somos tristes penas aturdidas,
(atônitas) (amedrontadas)
pequenas tezouras, canivete
dolente
que escrevemos dolorosamente
as palavras que haveis ouvido
ora vos diziam porque partimos
e viemos a vos aqui presentes:
a mão que se move diz que sente
coisa temerosa o coração pressente.
(tradução provisória da autora) (66)
|
Sugerimos que pouco depois de
1295, ocasião do lançamento de “Vita Nuova” de Dante e do surgimento das
diferenças políticas e filosóficas entre os dois amigos poetas (67), Guido Cavalcanti
tenha politizado com outro amigo, Giacomo de Pistoia da Universidade de Bolonha
e respondido a um texto a ele já dedicado - “Quaestio de Felicitate”, referido
à “felicidade intelectual” - de forma inédita, em versos filosóficos - através seu
célebre poema “Donna me prega...” (68).
Não acreditamos que “Donna me prega”
estivesse pronto por ocasião do lançamento de “Vita Nuova”, senão Dante teria já
notícia deste poema e não se surpreenderia com a mudança da postura filosófica
de seu maior amigo.
Em “Donna me prega” Guido Cavalcanti busca
definir “o Amor”, talvez melhor “a Paixão”, e deixa claro ao seu publico de modo
muito sutil, suas nítidas influências averroistas, avicenistas e aristotélicas,
influências realistas e controvertidas para a mentalidade religiosa de sua
época e de sua sociedade, controvertidas mesmo para seu amigo Dante.
Com
“Donna me prega” suas relações com a filosofia antiga e o materialismo estariam
confirmadas, não só por sua aplicação da lógica sobre a física, mas também
quando o poeta estabelece que a ética e “o bom” pertencem ao sensível (69).
Sendo o corpo seu próprio ponto de partida, “a
teoria que expressa, o léxico que usa” (70).
Trechos de “Dona me prega”:
“Donna me prega, - per ch´eo voglio dire
´un acidente – che sovente – è fero
Ed é si altero – ch´è chiamato amore:
.......................................................
Non
è vertute, - ma da qualle vène
Ch´è perfezione – (ché si pone –
tale),
Non razionale, - ma che sente, dico;
...................................................
Move, cangiando – color,
riso in pianto
E la figura – com paura - storna;
Senhora me pede – e quero dizer
de
acidente que frequente
é feroz e
tão exelso – chamado amor.
....................................................
Não é
virtude - mas daquela vem
que é
perfeição – (como tal se põe)
não
racional – mas que se sente – digo;
..........................................................
Move, mudando – cor, riso em pranto
e a figura
– com medo – retrocede;
................................................... (71)
Este poema de Guido Cavalcanti, “Donna me
prega”, por sua relevância filosófica e histórica foi comentado por inúmeros
autores e estudiosos nos séculos seguintes: Dino del Garbo, Giles de Roma,
Marsílio Ficino, Pico della Mirandolla e Francesco Vieri (72).
Uma tradução reinterpretada de “Donna me
prega” foi ainda realizado no século passado pelo poeta Ezra Pound e constitui
grande parte do Canto XXXVI de seu poema “Os Cantos”. Pound, com seus estudos
sobre Guido Cavalcanti, reitroduz a relevância deste poeta na história da literatura.
E Maria Luiza Ardizzone dirá com firmeza, já
neste século: “A fama de Cavalcanti como filósofo da natureza e lógico nos faz
perceber que ele anuncia a conecção entre a lógica e a física – a conecção pela
qual a moderna ciência emerge na civilização Ocidental” (73).
Ao
terminar, não podemos deixar de acrescentar ainda algumas palavras sobre a muito
dificil realidade cultural e política florentina na virada dos anos 1300, realidade
que auxilia a compreender a obra de Guido, pois concretamente marca seu o corpo
e abrevia sua vida.
Guido, desde antes de 1292, tinha o líder aristocrata
do partido “dos guelfos negros” (74), Corso Donati, decidido a preponderar, seu
inimigo pessoal declarado, dele e de sua família. Neste ano Corso teria mesmo pretendido
assassiná-lo (75). Com sua sensibilidade aguçada, Guido foi capaz de prever o
perigo representado pelos Donati sobre ele próprio, sobre o partido dos “guelfos
brancos”, mais liberal em Florença, e sobre a sua própria família Cavalcanti,
como um todo. Antevia ele o perigo e as desgraças que efetivamente se
concretizaram, com um possível domínio dos “guelfos negros” (76).
Em 1297, certamente para evitar estas
desgraças, Guido tentou atingir o inimigo Corso Donati com uma lança, durante
uma caçada, mas não foi bem sucedido nesta empresa, obstato pelos próprios amigos
(77).
Florença,
no fim do século XIII (ano 1300), permanecia conturbada por antigos conflitos políticos
e familiares entre “guibelinos” e “guelfos”, também dividida entre a “cultura
cívica do popolo” em ascensão e os reclamos
dos cerceados “magnati”, estes agora contidos e impedidos de participação na
vida pública; o partido dos “guelfos brancos” de Florença pouco depois abandonados
por um papado já também cercado de inimigos.
É posssível que nosso Guido, por tantas
pressões pessoais e políticas, tenha se tornado um adulto angustiado, excessivamente
autoconfiante, talvez veemente (78).
Apesar da
influência moral e cultural definitiva que Guido Cavalcanti exerceu sobre seu amigo
Dante, este teria tido agora dificuldade em compreeender a psique já tão ameaçada
de Guido, a radicalidade mesmo alcançada por seu pensamento filosófico e
político. Dante, mantendo-se ainda nos critérios religiosos e rígidos dos
Fideis d´Amore, não pode compreender e absolver “o primeiro de seus amigos’ (79).
O já notório poeta
Guido Cavalcanti, por ter participado de verdadeira batalha entre cavaleiros
“brancos” e “negros” numa praça de Florença, foi finalmente condenado pelo
governo republicano da cidade, entre os seis priores o próprio Dante, ao
confinamento em Sarzana.
Guido terá então
sua psique, já há muito ameaçada por conflitos pessoais e políticos, colocada
mais uma vez à prova, então de forma definitiva.
Vitimado pela
malária na prisão lhe é permitido morrer em Florença.
Mas em últimos
versos, na forma de uma pequena balada, sua voz se eleva muito leve e lúcida, com
maestria capaz de inspirar inúmeras gerações de Cavalcanti em Literatura:
“Bem sabes, Balladetta, como a
morte
já me constrange enquanto vai-se a vida.
Bem sabes que meu peito bate forte
por aquilo em que pensa todo espírito.
Meu ser de tal maneira é destruído
que nem resistir posso:
se me fazes favor leva contigo
minh’alma – isso te imploro –
quando ela abandonar meu coração.”
(trecho do famoso poema do exílio,
“Perch´il no spero di tornar
giammai “- Tradução do poeta Mário Faustino (80)
Sobre Guido
Cavalcanti acrescentamos alguns comentários literários recentes de críticos e consagrados
poetas, enfatizando as características realistas e concretas de sua lírica, tão
radicalmente moderna:
- “ São os mesmos conceitos
dos trovadores, mas realizados; não só ornados e aformoseados por fora, mas
transformados na sua substância, convertidos em caracteres, imagens,
sentimentos, o que quer dizer vida e ação.”.
Francesco De Sanctis, Storia della
letteratura italiana (1870-1871).
- “O poema citado por
[Ítalo] Calvino, em particular, é representativo dos diversos níveis em que se
desenrola a arte de Guido Cavalcanti: lá estão as coisas (penne, coltellin,
cesoiuzze), em toda a sua concretude e com vozes próprias, a serviço das
"cose dubbiose" que surgem inesperadamente no coração do poeta. Até
que ponto, então, Calvino se permitiu um exagero de ensaísta patrício do poeta
ao afirmar que foi o florentino quem abriu a "porta à poesia
moderna"?”.
Rodrigo Damasceno
– artigo “Guido Cavalcanti e as chaves da poesia moderna”, - Ciclo crítico “Guido
Cavalcanti”, brasileiro e recente no blog modo de usar e co.
- “Interioridade,
realismo, elegia... tudo contribui para criar uma impressão de “vivido” como
não resulta de nenhum outro poeta lírico românico anterior a Cavalcanti. Ele
demonstra, antes de Dante, que amor não é uma substância mas um acidente na
substância, o que equivale a dizer que amor é experiência vivida, e por isto a
poesia que provém dele é a primeira lírica moderna, verdadeiramente pessoal,
verdadeiramente lírica no sentido moderno do termo”.
Paolo Cherchi,
”Cavalcanti e la Reppresentazione” (2001).
- “Afinal, para Cavalcanti,
«a voz [...] é aquilo que permanece, em última instância, na total aniquilação
trazida pelo Amor»: ou seja, aquilo que permanece depois da morte, depois da
destruição. Cavalcanti pode, pois, ser considerado «o verdadeiro fundador da
lírica» não só «italiana», mas mais amplamente moderna, porquanto legou a seus
sucessores (que ainda se avistam entre nossos contemporâneos) a essencial
dialética entre voz e destruição, entre morte e sobrevivência.”.
Eduardo Sterzi
– artigo “Cavalcanti: Saltar sobre a morte” - Ciclo crítico “Guido Cavalcanti” -
blog modo de usar e co.
Notas
(1) Demurger, Alain – Os
templários, uma cavalaria cristã na Idade Média, Difel, 2007 capitulo 2.
(2) Torres, Rosa Sampaio – artigo
“Os Sdegnosos Cavalcanti” no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com/
(3) Fernandes, Raúl Cesar Gouveia - artigo “Amor e Cortesia na Literatura
Medieval”, http://www.hottopos.com , citando Frappier, Jean “Vues sur la Conception
Courtoise dans les Littératures d’Oc et d’Oïl au XIIe Siècle”, 1959, in: Cahiers de Civilisation Médiévale, II,
pp. 135-156
(4) Segundo as investigações recentes, o
trovadorismo teria sido mesmo originário dos mosteiros do Limousin, inspirado na
música litúrgica que fornece o modelo para o canto de amor profano, a relação
entre o poeta e a amada seguindo os padrões da relação feudal de vassalagem,
exigente na busca de perfeição.
Bertran de Born (c. 1179 – 1233),
chamado “o Filho”, foi senhor de Hautefort, cavaleiro e trovador do Limousin na
France, um dos maiores
trovadores ocitanos do seculo XII. Como o Hautefort está situado entre Limousin e o Périgord,
Bertran esteve envolvido nos conflitos dos filhos de Henrique II, Plantageneta. Também lutou
pelo controle de Hautefort. Escreveu dois “sirventes”,
canções satíricas e políticas, e três outros trabalhos a ele atribuídos. Dante
o cita na Divina Comédia como “semeador de cismas” no Canto XXVIII, talvez pelos conflitos que manteve com
seus irmãos.
Arnaut Daniel de Riberac foi um trovador do século XII-XIII, cuja obra foi
escrita em ocitano,
especificamente no dialeto limosino. Foi chamado
por Dante de "il miglior fabbro" ("o melhor criador"). Daniel
é considerado um dos principais representantes do “trobar clus”, ou estilo complexo e hermético
da poesia trovadoresca, apreciada pela elite. Foram conservadas 18 composições suas. A
admiração de Dante por Daniel foi representada no “De vulgari Eloquentia” e na “Divina
Comédia”, Purgatório (Canto
XXVI, v. 118-120 e 140-147), onde, descrevendo o encontro com o trovador,
Dante não utizou o toscano, mas sim a língua do próprio Daniel,
o ocitano.
Giraut
de Bornelh (c. 1138 – 1215) trovador de familia de juristas do Limousin, provavelmente Bourney, perto de Excideuil. A
ele é creditada a formalização, ou mesmo a invenção do “light style” ou “trobar
leu”, de aceitação popular. Noventa de seus poemas teriam subsistido. Uma de
suas peças seria um “planh”
(lamento) pela morte de Raimbaut de Orange. É possível que tenha
acompanhado Ricardo I, da Inglaterra, e Aimar V de Limoges na Terceira Cruzada e estado
com o “bom príncipe” da Antioquia, Balduíno III.
(5) “Guelfos”’ X “guibelinos”
- No século X a Itália era integrada ao Sacro Império Romano Germânico e o
rei da Germânia,
Oto I,
em 962, foi
coroado imperador em Roma. Mas no século XI,
o papado reagiu. As cidades do norte da atual Itália haviam ficado mais
independentes entre si, tornando-se centros econômicos
e políticos
importantes. A disputa das
Investiduras (1075-1122)
encerrou-se com a vitória do papado sobre o Império. Quando o conflito entre
Roma e o Império recrudesce e permite a entrada do imperador Frederico I, (Frederico
Barbarossa, 1122-1190), as cidades foram obrigadas a envolver-se e
dilaceraram-se entre guelfos (partidários da autoridade do papa) e gibelinos
(partidários do imperador). No século seguinte, o poder senhorial na
Toscana declinava e os senhores feudais florentinos travavam uma longa luta
entre si: de um lado estavam os nobres gibelinos que eram partidários do
imperador e do outro os guelfos, famílias talvez não tão antigas - que representavam
o partido apoiante do Papa. Nesta ocasião estas diferenças podiam, por vezes, encobrir
rivalidades familiares e locais.
As palavras ‘guibelino” e “guelfo são
originadas do conflito sucessório do imperador Henrique V (1125) , quando os
favoráveis ao Império apoiavam a casa da Suábia dos senhores do castelo de
Waibinglin, os Hohenstaufen, e o papa apoiava a casa da Baviera e Saxônia, dos
Welfen.
(6) Registramos o nascimento de
Guido Cavalcanti próximo do ano 1255, data preferida pelo genealogista Sylvio
Umberto Cavalcanti (TavolaCavalcalcantiFirenze pdf), coerente e encaixada com o
que observamos de sua biografia. Entretanto fontes comuns e enciclopédicas colocam
seu nascimento entre 1250 e 1258/59.
(7) A influencia clássica de Dante recebida
dos escritores latinos Virgilio, Ovídeo, Horácio, Cícero e outros. Reynolds, Bárbara
- Dante, Rio de Janeiro, Record, 2011, pg. 34, pg. 29. Estendemos a Guido Cavalcanti também está informação, levando em
conta a educação típica da época. Reynolds acrecenta ainda Lucano e
Estácio.
(8) A influencia da poesia siciliana
na Toscana se fez sentir pelo importante papel alcançado pela corte de Frederico II da Sicilia (1194-1250),
da dinastia dos Hohenstaufen, culto e laico, que nos meados do seculo recebeu
exilados inelectuais, árabes e judeus, além de trovadores provençais refugiados das
perseguições cátaras ou albigences. A poesia
desenvolvida nesta corte , de início eminentemente profana e fora do controle
da Igreja, pela influencia dos poetas provençais dará primazia aos idiomas locais e aos temas cavalherescos, adaptados agora a uma tecnica metrificada que desenvolve
baladas, canções e mesmo o soneto. Seus principais representantes são Andrea Capellano autor de “Del Amore” , escrito entre 1174 e 1204, e
mais tarde Pier delle Vigne, secretario de Federico II, os irmãos Guido e Oddo delle Colonne, Giacomino
Pugliese, Iacopo da Lentini.
A poesia siciliana é introduzida
na Toscana especialmente pelo poeta, político e jurisconsulto Guido Guinizelli (possivelmente
1230-1276), verdadeiro elo da
poesia siciliana com a poesia toscana do Doce Stil Nuovo. Guinizelli é
apresentado por Dante na Comédia, com o trovador Arnaut Daniel como pais dos
estilonovistas - escola na qual Guido Cavalcanti se inclui. Reynolds, Bárbara -
Dante, Rio de Janeiro, Record, 2011, pg. 418-419.
(9) Cátaros - Também chamados de albigenses, considerada heresia que têm semelhanças com o gnosticismo do início da nossa era. Os cátaros
preconizariam um dualismo
gnóstico, no qual o verdadeiro Deus distingue-se
absolutamente do criador do mundo físico. No mundo terreno de corrupção e trevas, as centelhas de luz
pertencentes ao verdadeiro reino divino estariam perdidas, exiladas e
precisariam ser resgatadas. Assim sendo
os sacerdotes deveriam afastar-se da
corrupção do mundo, com vidas simples e castas. Deveriam abster-se de
alimenta-se de carnes, de atividades sexuais e violência, não devendo possuir nenhum bem material. O catarismo
teria penetrado na Italia e, especialemente, no sul da França, no Languedoc,
especialmente na cidade de Albi. A cruzada muito sangrenta do papa contra os fiéis cátaros no Languedoc começa em 1208/1209, chamada cruzada albigense
e dura cerca de 35 anos. Luís VIII de França também participou desta Cruzada. Iniciada com a invasão de Languedoc, ela
só teve fim após diversas batalhas (onde se destacam a de Muret, em 1213, e a
de Toulouse, em 1218) logo após o Tratado de Meaux (1229). Na verdade, a
fortaleza de Montségur permaneceu até 1244 como um dos últimos pontos de
resistência cátara. O último reduto cátaro, a cidade de Quéribus, foi
tomada em 1256.
(10) Guibelinos ver nota 5.
(11) Não concordamos com a
afirmação de Barbara Reynolds em Dante, Rio de Janeiro, Record, 2011, pg.
34, que Guido seria “membro de uma próspera e aristocrática família de
guelfos”.
Ora, Florença no
século XIII era habitada por famílias ainda muito mais antigas e
aristocráticas, de origens muito antigas e e os Cavalcanti eram considerados na
época como de uma família nova, rica e muito poderosa de mercantes, apesar
de sua tradição de cavaleiros, oriundos possivelmente de pequena nobreza franca
ou aliada dos francos. Ver discussão Torres, Rosa Sampaio – “Os Cavalcanti no
século XIII”, próximo no 4sheared, já aberto a pesquisas.
Além do mais, o ramo Cavalcanti do pai
de Guido, um cavaleiro “guelfo”, depois da derrota de 1260 não estaria mais tão
próspero e seguro, devendo ter passado por momentos economicamente difíceis,
refugiando-se possivelmente em Lucca e servido depois mesmo aos d´Anjou. (Cavalcanti, Sylvio Umberto - opus cit.,
ano 1280).
O historiador Giovanni Villani, descrevendo a situação de Florença e sua
“sociedade de torres”, acreditava que as divisões entre guelfos e guibelinos em
sua origem seria relativo à antiguidade das familias, fato que havia gerado
um estado de guerra civil já no fim do seculo anterior, entre os anos 1178-80.
Villani, assim se refere às famílias
florentinas no começo do seculo XIII:
“Rossi non di antica progenie d´antichità; Frescobaldi, Bardi, Mozzi di picolo
comenciamento: Cavalcanti di poco tempo erano stratti di Mercanti; Cerchi
comenciavano a salire in istato.” (Cavalcanti, Sylvio Umberto - opus cit.,
pg. 5)
Sobre o verdadeira situação social de Guido
Cavalcanti, fato importante para entendimento de sua obra, ver discussão em Torres, Rosa Sampaio
– “Os Cavalcanti no século XIII” próximo no 4Sheared, já aberto a pesquisas.
(12) Reynolds, Barbara - Dante,
L.B. Tauris, London, 2006, pg.12. Cavalcanti, Sylvio Umberto – opus cit.,
ano 1266.
(13) Ver texto adiante e nota 29.
(14) Makin, Peter, Provence and Pound ,
University of Cambridge Press, 1978, pg. 204.
(15) Reynolds, Barbara - Dante,
L.B. Tauris, London, 2006, pg.12.
(16) Dante irá criticar Guido por
não apreciar o poeta clássico Virgilio, ao iniciar sua conversa com Cavalcante
Cavalcanti, no Canto X.
(17) A influencia de Guido sobre
Dante, Raynolds, Bárbara - Dante, L. B. Tauris, London, 2006, pg 13.
(18) Carlos I, Carlos de Anjou (1226 - 1285), foi rei de Napoles
e Sicilia (1266-1285), da dinastia Anjou e exerceu por breve tempo domínio no
mediterrâneo. Irmão mais moço de Luís IX da França. Conde de Provence em 1246 acompanhou a Luis (deois S.Luíz na Cruzada do Egito (1248-1254).
Aliado ao papado,
conquistou Nápoles e a Sicilia na década
de 1260, derrotando a Manfredo e a Conradino, os últimos representantes
da dinastia dos Hohenstaufen (do Santo Império Germanico), em Benevento (1266) e Tagliacozzo (1268). Estendeu seu poder às
Balcãs (1277) e chegou a herdeiro do Reino de Jerusalém. A introdução de funcionários franceses causou insatisfação
na Sicilia, ocorrendo aí rebelião em 1282 (Vésperas sicilianas). Os sicilianos acabam por
expulsar os angevinos com a ajuda de Pedro III de Aragão, derrotando a frota de
Carlos na baía de Napoles em junho de 1284. Carlos estava preparando contra ofensiva quando
morreu. Ver nota 8 e ainda nota seguinte.
(19) Carlos d´Anjou fora
convidado pelo papa Urbano IV e coroado pelo papa Clemente IV. Como seu irmão, o
rei frances Luíz IX, era simpatizante dos ideais guelfos. Em 1263 o papa Urbano
convidara d´Anjou para conquistar o reino da Sicilia então sobre o controle do
imperador do Sacro Império Germânico, Manfredo, que ele vencerá em Benevento,
na península italiana em 1266.
Carlos havia obtido vultosa
ajuda financeira dos banqueiros florentinos e preparara muito bem sua vinda
para a Itália, onde livra Florença dos guibelinos, dirigindo a cidade por dez
anos, certamente com a colaboração dos
Cavalcanti. A pesar de tornar-se rei de
Jeruzalem em 1277, não conseguiu conquistar Constantinopla como era seu desejo.
O pai de Guido Cavalcanti esteve a serviço dos
dÁnjou na Toscana depois da derrota na batalha de Montaperti em 1260. (Cavalcanti,
Sylvio Umberto – Se Chiamavono Cavalcanti, pdf, ano 1280.).
Observamos que os d´Anjou e os
Cavalcanti há muito teriam uma história em comum e uma grande identidade, pois,
segundo a tradição, os Cavalcanti seriam provenientes de pequena nobreza de
cristãos francos, a que tudo indica de mesmo passado angevino, soldados-cavaleiros
vindos para a Toscana com Carlos Magno. A este respeito consultar Torres Rosa
Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, o recente “Os sdegnosos Cavalcanti”,
ainda outros artigos da série “Cavalcanti em busca de sua origem”, todos já em http://rosasampaiotorres.blogspot.com/.
Ainda em finalização “A família Cavalcanti - Florença – século XIII”, já aberto
a pesquisas.
(20) Honras para Sordello são
citadas em Makin, Peter - Provence and Pound, University of Cambridge Press,
1978, capitulo “Sordello, Cunizza e a cultura provençal na Itália”, pg. 203. Que
Sordello tenha sido assassinado é sugestão de Dante na Divina Comedia, CantoVII,
pois colocado no Purgatório por não ter obtido confissão e reconciliação em
virtude de morte súbita.
(21) O feliz encontro de Virgílio
com Sordello, ambos mantuanos, e a reação de Dante, fora da cena, lembrando dos
desvario de sua cidade são comentados por Barbara Reynolds – Dante, Rio
de Janeiro, Record, 2011, pg. 366-368.
(22) Comentários sobre este trabalho de Browning, Stopford Brooke - Browning,
1902 e Duff, David - An exposition of
Browning´s Sordello, 1906, citados por Makin, Peter - Provence and Pound,
University of Cambridge Press, 1978.
(23) Makin, Peter - Provence
and Pound, University of Cambridge Press, 1978, pg. 204, que recomendamos para
complementação de informações sobre Sordello, capitulo “Sordello, Cunizza e a
cultura provençal na Itália”. Ainda mais informações Lollis, Cesare – Vida e
Poesia de Sordello da Goito, Halle, 1896.
(24) Cavalcanti, Sylvio Umberto –
Se Chiamavono Cavalcanti, pdf, ano 1266.
(25) Sobre Cunizza da Romano e sua família
materna ver fonte local “Rocca de Cerbaia” - Erio Rosetti; Luca Valenti, L´Altra Toscana
. Guida ai luoghi d´art e natura poco conosciuti. Firenze, Le Lettere, 2003.
Sobre a ferocidade de seu irmão Ezzelino III, lider militar guibelino várias
são as fontes a consultar. Sobre Cunizza da Romano mais informações em
Makin, Peter – opus cit. pg. 186 e capitulo “Sordello, Cunizza e a
cultura provençal na Itália”, pg. 203.
(26) Sobre a imagem do “olhar de
leão a espreita”, Makin, Peter - Provence and
Pound, University of Cambridge Press, 1978, pg. 204. Sobre “o olhar de leão à espreita”, ver também
Barbara Reynolds – opus cit. Ed. em português, pg. 366.
(27) Do original de Dante na Divina
Comédia, Canto do Purgatório VI,
61-66. Cena descrita por Reynolds, Bárbara – Dante, Rio de Janeiro,
Record, 2011, pg. 366-368.
(28) Sobre a campanha de Carlos
Magno e sua vitória sobre os lombardos, consultar Torres, Rosa Sampaio – artigo
“Os Sdegnosos Cavalcanti”, e outros artigos da mesma autora neste http://rosasampaiotorres.blogspot.com/
Baseado em genealogia de Davide Shama,
o prenome Guido na família Cavalcanti viria dos conde Guidi di Modigliana, de
linha franca mas já com cruzamento lombardo, por linha feminina: uma filha do
conde Guido Guerra III, ou Guido Sangue, casada com Gianulietto Cavalcanti no
século XI, na Toscana.
(29) Mais comentários sobre as
relações entre Guido e Dante, Reynolds, Bárbara – Dante, Rio de Janeiro,
Record, 2011, capitulo “Os primeiros anos” e o capitulo “Dante e Guido
Cavalcanti”.
(30) Sobre as armas dos Cavalcanti
e a influencia da Ordem dos Templários, Torres, Rosa Sampaio – artigo
“Cavalcanti no séc. XIII”, em finalização mas já aberto a pesquisas.
(31) Torres, Rosa Sampaio –
artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, acima citado.
(32) LXXIX Congresso
Internazionale della societa Dante Alighieri, acontecido em Bolzano e Merano. Ver
ainda nota a seguir, nota 34.
(33) Ibañez, José Maria – Enigmas
e Mistérios, Es Ediciones, Madri, 2009, capitulo “Templo en homenage a la
Divina Comedia”, pg. 108, artigo erudito, mas sem fontes, afirma que a “Fede
Santa” (depois provavelmente os Rosa Cruz), os “Fideis D´Amore” e os
franciscanos seriam, na verdade, ramos distintos da mesma Ordem Terciária dos
Templários, laica ou secular. E os Fideis d´Amore o núcleo do Dolce Stilo
Nuovo. Afirma ainda o autor, e deixamos esta informação sobre questionamento,
que Dante teria sido introduzido por Brunetto Latini em 1290, depois, mesmo,
grão mestre da “Fede Santa”, cujos fiéis se chamavam Fideis d`Amore.
(34) No LXXIX Congresso
Internazionale della societa Dante Alighieri, acontecido em Bolzano e Merano em
setembro de 2009, foi citada como fonte de referências o estudioso de religiões e simbologia
francês, René Guénon (1886-1951).
Segundo René Guénon, L’ésoterisme de Dante, Galimard, Paris,
1957, Dante teria conhecido de fontes profanas a obra de Ibn ‘Arabi
(1165-1240), sufi místico e filósofo andaluz, e certamente ocultava este fato,
principalmente porque não via inconveniente em citar outros filósofos islâmicos
como Avicena e Averrois. René Guénon
percebe, ainda, os vínculos que existiram entre a Ordem do Templo e a seita
islâmica dos Haschischin (mal traduzido por assassinos ou por “gente do
Haschischin”). Para Guénon a palavra “Haschischin” só poderia se traduzir como
“Guardiões da Terra Santa”, a mesma designação que os Templários davam à sua
própria Ordem. O fato teria sido
assinalado também por J.H. Pronst-Biraben, em “Os Mistérios dos Templários”, [s/ed.].
As semelhanças entre as organizações iriam mais longe, passando por suas
estruturas hierárquicas e inclusive pela adoção das mesmas cores, branca e
vermelha.
Em outras
fontes menos seguras encontramos ainda que os criadores do “Dolce Stil Nuovo”,
na literatura, estariam inspirados num livro de mística xiita intitulado
“Jardim dos Fiéis do Amor” ao criar sua irmandade secreta dos “Fideis D´Amore”.
Guido e Dante ligados aos “Fideis d´Amore” por influencia de Bruno Latini.
Outra fonte também
insistente, o esotérico Dr. Carlos Raitzin, afirma que grandes figuras da
literatura italiana teriam também passado pelos “Fedeli d’Amore”: Bocaccio,
Petrarca, Andreas Cappelanus, o Cardeal Francesco da Barberino, Dino Compagni,
como também Bruno Latini. E que os Fedeli d’ Amore possuíam uma doutrinária própria,
à primeira vista de origem templária, porém de fato ismaelita (Ordem dos
Haschischin), portanto, uma doutrina iniciática.
(35) Reynolds, Bárbara - Dante, L.B. Tauris, London, 2006, cap. “Dante
and Guido Cavalcanti.”
(36) Valli Luigi - Il linguajo
secreto di Dante e dei Fideli d´Amore”, NA Roma, Biblioteca di Filosofia e
Scienza, Casa Editrie Optima, 1928.
Discussão e aprofundamento do assunto Torres,
Rosa Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, em finalização com todas as fontes,
próximo no 4sheared, já aberto a pesquisas.
(37) Soneto poema XXXVIII em Rima
resposta de Guido para Dante.
Vedeste ao mio parere, omne
valore
e tutto gioco e quanto bene om sente,
se foste in prova del segnor valente
she segnoreggia il mondo de l´onore...
(38) Guido Cavalcanti certamente
frequentou a Universidade de Bolonha. Em
1287, ao que tudo indica seu irmão Jacobo Cavalcanti, talvez bem mais moço,
esteve também estudando em Bolonha com o jovem Dante, então com vinte e dois
anos.
Sabemos pela História da Literatura que
Dante estudou nesta Universidade, fundada em 1208, por alguns meses. Jacobo aí estreitou
sua amizade com Dante, a ele possivelmente próximo em idade, tendo escrito três
sonetos.
Pela
famosa e precursora Universidade de Bolonha passaram, também, os contemporâneos
de Guido - Guido Guinizelli e Cino de Pistoia e, mais adiante, Petrarca. Dino
del Garbo, por volta de 1295, estudou o filósofo Avicena no Estúdio bolonhês e posteriormente
foi um dos primeiros autores a comentar, de forma médica, a poesia de Guido “Donna
me prega”.
Especialmente Tadeo Alderotti (1215-1295)
teria sido físico e médico florentino, professor desta mesma Universidade de Bologna
e, via seus ensinamentos, segundo a crítica literária Ardizzone, Guido
Cavalcanti (por suas metáforas do “diáfano”) teria tomado conhecimento de teoria
da ótica Alhazen. Ver mais detalhes e fontes na nota 46 e ainda
outras informações sobre as relações de Guido Cavalcanti com a Universidade de
Bolonha na nota 64.
(39) Vaugham, Robert - The
British quaterly Rewiew, vol. 47, London, Hodder and Stoughton, 1868, pg. 396,
citando o trabalhos de Dante Rossetti e Theodore Martin sobre “Vita Nuova” de
Dante e seus comanheiros poetas, usa ainda para Guido Cavalcanti os adjetivos
“self-reliant” (autoconfiante), “moody” (mal humorado, angustiado) e ‘vehement”
(veemente), mas acrescenta “..he was also distingished by personal beauty,
hight accomplishments off all kinds and daring nobility of soul.” As referencias
como ‘moody”, possivelmente teriam mais a ver com sua última fase de vida. Ver
ainda texto adiante e comparar nota 78.
(40) Descrição de Guido
Cavalcanti por seu contemporâneo Dino Compagni, Crônica I: xx,
literalmente: “cortese e ardito, ma sdegnoso e solitário e intento allo
studio”. Ver melhor significado da palavra “sdegnoso” na nota a seguir 41.
(41) A descrição que valoriza a jovem
veia filosófica de Guido é a de Boccacio, Giovanni – Decameron, 6º dia,
nona novela, “A cena do cemitério”, conto que cremos indispensável para compreensão
do poeta. Esta descrição de Guido também
é referida por nosso poeta Haroldo de Campos em Pedra e Luz na Poesia de
Dante, Imago, 1998, cap. “O Dolce Stil Nuovo, Bossa nova no Duecento”, pg.
14.
Boccacio usa para qualificar Guido a
palavra “sdegnoso”, que interpretamos como, altivo, indignado, sombranceiro,
desdenhoso, não respeitoso. O adjetivo “sdegnoso” no sentido por nós traduzido é
também frequentemente usado para descrever como um todo a família Cavalcanti no
século XVI, já em sua ação contra os Medici. Consultar Torres, Rosa Sampaio –
artigos “Conspiração Pucci & Cavalcanti” e “Os Sdegnosos Cavalcanti”, ambos
em http://rosasampaiotorres.blogspot.com/
Guido é descrito como “espirituoso e
profundo” por Reynolds, Bárbara - Dante, Rio de Janeiro, Record, 2011, pg.
44.
(42) Uma primeira tentativa detalhada
de reconstituição biográfica de Guido é tentada em Torres, Rosa Sampaio –
artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, próximo no 4sheared, trabalho alentado e em
finalização, mas já aberto para consultas. Neste trabalho o aprofundamento das questões
biográficas e políticas é realizado, com todas as fontes indicadas.
(43) Sobre a influência de Averroes
consultar especialmente Nade, Bruno - “Polemica sobre Averroismo de Guido
Cavalcanti”, 1954 - Ed. da Universidade de Roma, e Ardizzone, Maria Luíza - Guido
Cavalcanti: the other Middle Ages, Toronto Press, 2002.
Sobre Guido Cavalcanti e sua leitura de Carlos
Magno, referida em Reynolds, Bárbara – Dante,
Rio de Janeiro, Record, 2011, pg. 44.
Para a influência de Avicena, Anichini, Frederica - Voices of the Body, liminal
grammar in Guido Cavalcanti´s Rime, vol. 6, Interkulturelle Begegnungen,
Meidenbauer, 2009.
Sua influência de Averrois na Univeridade
de Bolonha ver nota 38. Acompanhar a exposição no texto
a seguir e notas referentes.
(44) Os árabes, após terem conquistado o oriente helenista, entraram
em contato com a cultura grega, especialmente na Síria. Ao estender suas
conquistas até o ocidente europeu, trouxeram uma cultura já influenciada pelo aristotelismo.
Os maiores filósofos árabes conhecedores de Aristóteles e que influíram
profundamente sobre o Ocidente latino-cristão, foram Avicena e Averrois.
Avicena, (Bucara, Persia, 980 - Hamadã, 1037) tentou harmonizar
a filosofia aristotélica com o platonismo e a religião islâmica. Utilizou-se das idéias de Aristóteles para
provar a existência de Deus, afirmando que, Nele, existência e essência seriam iguais:
Deus igual à sua essência e fonte do ser de outras coisas. Foi o autor de “Líber Canonis”,
vasta obra dedicada a assuntos de
medicina. O seu “Canonis” foi traduzido no século XIII, para o latim por Gerardo de Cremona toda a Europa. Depois de
Avicena todo o trabalho farmacêutico e matéria médica foi influenciado pelo seu
trabalho. Ficou conhecido como o príncipe dos médicos.
Quanto a Averrois, até sua produção, de
Aristóteles no Ocidente conheciam-se apenas os tratados lógicos. Assim o
trabalho de Averrois como comentarista de Aristóteles contribuiu, de modo
decisivo, para introduzir o aristotelismo
no mundo do pensamento
cristão, dominado, até essa época,
pela influência platônica e neoplatônica. Sobretudo, Averrois afirmava a subordinação da religião
à filosofia quando as argumentações delas fossem conflitantes, considerando a
religião como uma filosofia simbólica.
No começo
do séc. XIII, Miguel Escoto já havia traduzido, para o latim, os comentários de
Averróis ao “De Caelo” e ao “De Anima”, de Aristóteles.
Mais tarde sentiu-se a
necessidade de traduzir diretamente do grego as obras de Aristóteles, e, por
conselho de Tomás de Aquino, Guilherme de Maerbeke (+1286) fez essa tradução, que proporcionou aos latinos o conhecimento do
genuíno pensamento de Aristóteles.
Mais informações básicas sobre Averrois e
Avicena, texto a seguir, notas 46, 49, 50, 51, 61, 69,70, e ainda
Ferrater-Mora, José- Dicionário de filosofia – verbete Averrois
Ed.Loyla, 2000, com exelentes bibliografias filosóficas específicas.
(45) Boccacio, apesar de viver
uma geração depois, afirma no Decameron (VI, 9) que as especulações de
Cavalcante Cavalcanti visaram apenas questionar se Deus pudesse não existir
(“si diceva tralla gente volgare che queste sue especulazione erano solo in
cercare se trovar si potesse che Iddio no fosse.”).
Mas o ateísmo de Cavalcante Cavalcanti, e consequentemente
também o ateísmo de seu filho Guido, foram criticados por Dante, no Canto X da Divina
Comédia. Ver mais nota 43.
(46) Andréa Sauderson em recente
tese de mestrado para a Universidade de McGill, Montreal, “Aspects of Rhetoric,
Poetics and Logic in the minor poems of Guido Cavalcanti”, 2006, pg. 66 pdf, citando
como fonte Ardizzone, Maria Luiza - Guido Cavalcanti: the other Middle Ages,
Toronto Press, 2002, pgs. 21, 24, 19, 123,127, afirma que Guido Cavalcante
teria tido contato com Averrois e outros filósofos árabes, atravez Taddeo
Alderotto que na época lecionava estes autores na faculdade de Medicina na
Universidade de Bolonha.
Dino del Garbo, por volta de 1295 estudava Avicena no Estúdio bolonhês e
posteriormente foi um dos primeiros autores a comentar, de forma médica, a poesia
de Guido “Donna me prega”.Tadeo Alderotti foi físico e médico florentino (1215-1295),
professor desta mesma Universidade de Bologna e via seus ensinamentos, segundo
Ardizzone opus cit. pg.132, Guido Cavalcanti (por suas metáforas do
“diáfano”) teria tomado conhecimento com a teoria da ótica, “através Averrois e
provavelmente Alhazen” (965-1040) - físico e matemático árabe que observou, depois
de Ptolomeu, os fenômenos de refração da luz.
Ver mais texto adiante e nota 64.
(47) Cavalcanti, Sylvio Umberto –
opus cit., ano 1273.
(48) Aldobrandino Cavalcanti
(Ildobrandinus), foi grande figura da família Cavalcanti no século XIII, referido
por Cavalcanti, Sylvio Umberto – opus cit., nos anos 1217, 1261, 1262,
1273, 1275,1279. Este genealogista chega a afirmar, opus cit., pg. 14: ”Estudos
recentes revelaram que alguns sermões atribuidos originalmente a S. Tomas foram
escritos pelo próprio Aldobrandino.
Autor de artigo na Enciclopédia Treccani, Dizionario Biografico degli
Italiani - Volume 22 (1979), Agostino Paravicini Bagliani, confirma também que
textos originalmente de Aldobrandino foram atribuídos a Tomás de Aquino.
O religioso Remigio de Girolami, que foi o orador nas exéquias de
Aldobrandino, foi quem deu continuidade e difusão da doutrina Tomista.
O sepulcro de Aldobrandino, ainda hoje, na Igreja Santa Maria Novella, é
adornado com insígnias dos Cavalcanti, vermelho e branco, em destaque.
Aldobrandino Cavalcanti já é referido
como possível influência de Guido Cavalcanti em uma enciclopédica na
mídia eletônica (Wikipédia italiana), sem fontes: “Secondo i più recenti studi fu uno dei maestri di Guido
Cavalcanti, suo parente”.
(49) Acrescentamos que Tomás de
Aquino, e pelo indicado também Aldobrandino Cavalcanti, tentaram realizar uma síntese
do cristianismo
com uma visão aristotélica do mundo. Reintroduzindo o aristotelismo
que é redescoberto por Avicena e Averrois e, comparando a escolástica anterior
com o pensamento de Aristóteles, Tomás de Aquino reavalia o materialismo de Aristóteles,
permitindo uma nova base filosófica para sua teologia. Em suas duas “summae”, a
“Summa theologiae” e a “Summa contra gentiles”, tenta
sistematizar o conhecimento teológico e filosófico de sua época. Como ser
racional, o homem teria livre escolha e, orientado pelo clero, seria capaz de tingir
a salvação pelas boas ações e pela caridade. Assim sendo critica a ambição do
ganho, o lucro e o empréstimo de dinheiro a juros (usura). Ainda que
contestando o averroísmo, São Tomás tenta na época a conciliação, a síntese
possível do pensamento
aristotélico e o da revelação
cristã.
(50) A leitura Alberto Magno por Guido
de é afirmada por Reynolds, Barbara- Dante, Rio de Janeiro, Record,
2011, pag.44.
Aristóteles,
introduzido na versão árabe, exigiu das Universidades europeias um trabalho
de exegese e de assimilação,
pois ao conhecimento da época não
era possível
nem aceitar, nem ignorar sua presença.
A essa tarefa se consagraram Alberto Magno e Tomás de
Aquino.
(51) Amalrico de Bene (-1206/7) e
David de Dinant (1200-?) em suas trabalhos teriam divulgado teses averroístas,
muitas das quais foram condenadas em 1270 e 1277 por Etienne Tempier, arcebispo
de Paris.
A condenação de 1277 referia-se,
especialmente, à doutrina das “duas verdades” e à “da unidade
do intelecto
agente”, defendidas por Sigério de Brabante (1235-1284) e Boécio
de Dácia (-1260).
Aprofundamento
da discussão filosófica, Ferrater-Mora, José - Dicionário de filosofia –
verbete Averrois Ed. Loyla, 2000, com exelente bibliografia específica. .
(52) Najemy, John– A History of Florence
1200-1575, Blackwell Publishing, 2006, pg. 29, tendo como fonte L.Nelson, The Poetry of
Guido Cavalcanti, NY,1986.
(53) Reynods, Bárbara – Dante,
Rio de Janeiro, Record, 2011, cap.”Os primeiros Anos” pg.44. Citando
textualmente: “O próprio Cavalcanti era espirituoso e profundo, um estudioso de
Filosofia, leitor de Alberto Magno e Averróis. Em seus poemas ele mostrava
de que forma termos de fisiologia e de psicologia podiam fornecer um novo
vocabulário para analisar os efeitos do amor, termos que Dante tomou emprestado”
(os grifos são nossos). Esta autora prossegue o capitulo relacionando os
exemplos da influência de Guido Cavalcanti sobre a obra de Dante.
(54) Campos, Haroldo de - Pedra
e Luz na Poesia de Dante, Imago, 1998, pg.69,
(55) Campos, Haroldo de – opus cit., pgs. 174, 175. Epicurismo,
segundo sugestão de Boccacio, seria o pecado em que teria incorrido Farinata
degli Uperti por ser apreciador exagerado dos prazeres da mesa, e justificação
para sua colocação, por Dante, no Inferno. Haroldo de Campos torna o termo
epicureo como sinônimo de ateu. Ver discussão Torres, Rosa Sampaio – artigo
“Cavalcanti no séc. XIII”, próximo nos 4shared e também “Guido Cavalcanti –
Conclusões”, ainda em elaboração.
(56) Reynolds,
Bárbara - Dante, L.B. Tauris, Londres, 2006, pg. 12.
(57) West, Simon - The selected Poetry of Guido Cavalcanti,
Troubador Publishing Ltd., pg. 18.
(58) Ver poema citado adiante no
texto e mais observações em Torres, Rosa Sampaio “Os Cavalcanti no século
XIII”, já aberto pesquisa.
(59) Anichi, Frederica
- Voices of the Body, liminal grammar in Guido Cavalcanti´s Rime, vol. 6
de Interkulturelle Begegnungen, Meidenbauer, 2009, pg. 105.
(60) Ardizzone,
Maria Luíza - Guido Cavalcanti: the other Middle Ages, Toronto Press,
2002.
(61) Anichini, Frederica - Voices
of the Body, liminal grammar in Guido Cavalcanti´s Rime, vol. 6, Interkulturelle
Begegnungen, Meidenbauer, 2009, pg.105, afirma ainda: «” l´ímpiego
nella poesia di Cavalacanti di un contenuto técnico e specialistico richiamato
dalle sinapsi con il manuale di medicina aviceniano acquista dunque il
signficado di un poetare singolare: i materiali che lo compgno, provenienti dall´
ambito della filosofia naturale e da medicina constituiscono il legame, la
prova di un cammino « altro »... un sabere alternativo....
(62) Aniche, Frederica - “La poesia del corpo in Guido Cavalcanti”, diss. New York U, 2002, pg. 56.
(63) Ardizzone, Maria Luiza - Guido Cavalcanti: the other Middle Ages,
Toronto Press, 2002, pg.132. Dino del Garbo, por volta de 1295
estudava Avicena no Estúdio bolonhês e posteriormente foi um dos primeiros
autores a comentar, de forma médica, a poesia de Guido “Donna me prega”.
(64) O poema “Donna me prega” de Guido Cavalcanti foi
comentado por inúmeros autores e estudiosos nos séculos seguintes à sua morte:
Dino del Garbo, Giles de Roma, Marsílio Ficino, Pico della Mirandolla e Francesco
Vieri, segundo o autor Fenzi Eurico, La canzone d´amore di Guido Cavalcanti
ei suoi antichi commenti, Melangolo, 1999, trabalho comentado
favoravelmente por Ardizzone, Maria Luiza, Guido Cavalcanti: the other Middle
Ages, Toronto Press, 2002.
Uma tradução reinterpretada de “Donna me
prega” por Ezra Pound constitui grande parte do Canto XXXVI de seu poema “Os
Cantos”.
Entretanto, segundo ainda Maria Luiza Ardizzone
(em “Guido Cavalcanti: the other Middle Ages”, Toronto Press, 2002, pag.103,
capitulo “Pleasure and Intellectual Happiness: Guido Cavalcanti and Giacomo de
Pistoia”) um texto de Giacomo de Pistoia, com o título “Quaestio de
Felicitate”, dedicado a Guido, circulou entre 1290 e 1300 na Unversidade de
Bolonha e a este texto Guido teria respondido, de forma inédita, com a feitura
de sua poesia filosófica “Donna me prega”. O texto dedicado de Giacomo de
Pistóia foi descoberto recentemente por Paul Oskar Kristeller na biblioteca de
Stuttgard, em 1950, e a discussão na crítica literária, a partir daí, tem lugar.
Ver também os comentários sobre a
importância filosófica do poema “Donna me Prega’ em Ardizzone, Maria Luiza - opus
cit.
(65) Sauderson, Andréa - “Aspects of Rhetoric,
Poetics and Logic in the minor poems of Guido Cavalcanti”, 2006, pg. 66. pdf
(66) Guido Cavalcanti, Soneto
XVIII, das Rimas.
(67) “Vita Nuova”, vinda a público
neste mesmo ano de 1295, se compõe de poemas escritos por Dante entre 1283 e
1293, e foi dedicada ao “il primo dei suoi amici”, naturalmente Guido. Cavalcanti,
Sylvio Umberto – opus cit., pg. 21.
Dante aceitara o conselho de Guido de
escrever a obra em “volgare”, uma posição transgressora e mesmo inovadora para
a época. Mas teria ficado surpreendido, com as contraposições colocadas pelo amigo
dileto, segundo a critica literária. Guido teria apresentado ao amigo
divergências realmente filosóficas, pois não via mais no Amor um caminho para
atingir o divino, como ainda percebia Dante, mas sim um sentimento que se
insinuria pelos olhos, perturbando a alma.
Não acreditamos que “Donna me prega” já
estivesse pronto nesta época, senão Dante dela já teria notícia e não se
surpreederia com a mudança filosófica do amigo. A nosso ver, “Donna me prega” não teria
vindo a público antes de 1295, pois Dante já teria sabido do poema e não se
surpreederia com as novas considerações do amigo. Ver ainda discussão em
Ardizzone, Maria Luíza - opus cit., Capitulo
4.
Ver também
Torres, Rosa Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, acima citado e a nota
em seguida.
(68) Este texto de Giacomo de
Pistoia, segundo Ardizzone, Maria Luiza - Guido Cavalcanti: the other Middle
Ages, Toronto Press, 2002, pg. 104, com o
título “Quaestio de Felicitate”, que se referia à “felicidade intelectual”, foi
dedicado a Guido Cavalcanti e circulou entre 1290 e 1300 na Unversidade de
Bolonha; a este texto Guido teria pretendido responder filosoficamente atravez sua
poesia “Donna me prega...”. Ver também nota 64.
Lembramos que por volta de 1287
Jacobo Cavalcanti, que seria irmão de Guido esteve em Bolonha, provavelmente estudando.
(69) Ardizzone, Maria Luiza - Guido
Cavalcanti: the other Middle Ages, Toronto Press, 2002, pg. 10 afirma ainda em seu livro, todo dedicado à
leitura de Cavalcanti, na pg. 128: “The relation between Cavalcanti´s “Donna me
prega..” and the materialism
ascribed to Epicurism is confirmed. Cavalcanti´s canzone afirms its relation
with the old philosophy not only when it applies logic to physics but also when
the poet establishes for ethics a good that belongs to the sensible”. (os grifos são nossos)
Andréa Sauderson em sua tese de
mestrado citada - “Aspects of Rhetoric, Poetics and Logic in the minor poems of
Guido Cavalcanti”, 2006 - analisa ainda os próprios textos de Retórica e da
Poética de Aristóteles, colocados em paralelo com os textos e as colocações
teóricas do poeta Guido Cavalcanti.
(70) Andréa Sauderson, na tese citada
em nota acima, repetindo as colocações de Frederica Aniche afirma: “O fenômeno
fisiológico das emoções é a chave para a poesia de Cavalcanti. O corpo é o
ponto de partida de Cavalcanti, para a teoria que ele expressa e o léxico que
ele usa. Ele usa a terminologia do “Líber Canonis” de Avicena.” (a tradução é
nossa).
(71) Traduzidos pela autora
apenas trechos do poema original.
(72) Fenzi, Eurico - La
canzone d´amore di Guido Cavalcanti ei suoi antichi commenti, Melangolo,
1999, trabalho comentado muito favoravelmente por Ardizzone, Maria Luiza, Guido
Cavalcanti: the other Middle Ages, Toronto Press, 2002.
(73) Ardizzone,
Maria Luiza, Guido Cavalcanti: the other Middle Ages, Toronto Press,
2002, pg. 133.
(74) No fim do século, o partido “guelfo” vencedor
sobre os guibelinos se dividiu, em Florença em duas facções: os guelfos brancos
(Guelfi Bianchi), liderados por Vieri dei Cerchi e Guido
Cavalcanti, e os guelfos negros
(Guelfi Neri), liderados por Corso Donati. Os Cavalcanti estiveram, quase todos, entre os “guelfos
brancos”. Na origem dessa divisão existiria uma querela de clãs que opunha os
Cerchi, Cavalcanti e outras famílias aos
Donati. A divisão era também social, sendo os Cerchi - uma antiga família
patrícia florentina - mais próximos do povo, enquanto os Donati - uma das
famílias mais numerosas e importantes da Florença medieval - mais ligados à
elite florentina. Os Donati sobretudo se opuseram às
decisões judiciais republicanas de Giano della Bella.
(75) A tentativa de assassinato
de Donato teria ocorrido em 1292 quando de uma peregrinação de Guido à São
Tiago de Compostela. Cavalcanti, Sylvio Umberto – opus cit., ano 1292. Também Torres,
Rosa Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII” próximo no 4sheared.
(76) Os episódios ocorridos
depois da morte de Guido e por ele previstos, são detalhadamente comentados em Torres,
Rosa Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, acima citado.
(77) Guido teria tentado revidar à
tentativa de Corso Donati em 1297, durante uma caçada, não conseguindo por
interferência de amigos. Cavalcanti, Sylvio Umberto – opus cit., ano 1297.
(78) As circunstâncias políticas intimamente
ligadas à vida de Guido são com detalhes analisadas em texto com todas as
fontes referidas Torres, Rosa Sampaio – “Cavalcanti no Sec. XIII”, em finalização,
mas já aberto para consultas.
Vaugham, Robert - The British Rewiew, vol.
43, London, Hodder and Stoughton, 1868, pg. 396, usa para Guido os adjetivos “self-reliant”
(auto confiante), “moody” (mau-humorado, angustiado) e “vehement” (veemente),
características que se adaptam ao Guido mais velho, já experimentado e sofrido
na vida política. Comparar com o afirmado na nota 39.
(79) O ateísmo de Cavalcante
Cavalcanti, e também o possível ateísmo de seu filho Guido, foi abordado por
Dante, no Canto X da Divina Comédia.
No
círculo do Inferno em que fora colocado como ateu por Dante, Cavalcante
Cavalcanti saíra do próprio túmulo para indagar ao poeta se seu filho Guido
ainda estava vivo, fato que surpreendeu sobremodo a Dante que pensava saber
ele, mesmo no Inferno, das coisas do presente. Na verdade Cavalcante
Cavalcanti, num jogo crítico criado pelo próprio Dante, ali só saberia as
coisas do passado e previa as do futuro, já que pretendera saber tudo do
presente.
Entretanto o não entendimento completo do
crime político de Guido parece ser em verdade o pano de fundo desta cena, ainda
que não abordado diretamente por Dante na Comédia.
Observamos que a falta de fé de
Virgilio, sua única culpa, é perdoada pelo poeta Dante que o coloca, por esta
falta, apenas no limbo, tornando-o mesmo orientador em sua viagem.
Dante como membro da agremiação que
congregava médicos e boticários conhecia os trabalhos de Averroes e Avicena,
que cita na sua obra, mas parece não deu ressalte aos seus trabalhos, ainda que
respeitasse a obra de Aristóteles. Como membro dos Fideli d´Amore, Dante
demonstrou sempre uma fé inabalável na vida após a morte. Ver discussão em Reynolds,
Bárbara – Dante, Rio de Janeiro, Record, 2011, pg. 113.
Ver
ainda nota 45 e comentários sobre o ateísmo de Guido e seu pai em Torres, Rosa
Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, em finalização, já aberto ao
publico para consultas.
(80) Mais sobre a situação política
de Florença, a biografia de Guido Cavalcanti consultar trabalho histórico, Torres,
Rosa Sampaio – artigo “Cavalcanti no séc. XIII”, acima citado.
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