segunda-feira, 9 de junho de 2014

Ao relembrar Milton Santos

Recentemente trouxeram-me a lembrança um caro nome - o de Milton Santos.


Era ele intelectual respeitado, de cor negra, o que menos importa, ainda que coisa rara entre nós. Intelectual respeitado internacionalmente, o que talvez importe muito. O fato de ter sido punido pela ditadura, talvez, fato ainda mais relevante, talvez mesmo um galardão.

Com ele foram punidos tantos de sua geração... lembro, os meus melhores mestres.
Aqueles que, ao perceberem uma aluna dedicada, se debruçavam sobre ela com carinho.

Assim meu querido amigo, incentivador e mestre, José Werneck da Silva, punido também pela ditadura, historiador sério, paraninfo sistemático das turmas da PUC onde se refugiou. Ao final se dizia, com modéstia, um dedicado mestre escola.

Hugo Weiss, a quem dediquei minhas pesquisas sobre o Tenentismo. Através dele descobri minha própria vocação para o estudo da História, por suas boas notas, seu interesse pelo bem de seus alunos, seu conhecimento sólido. Vocação podada de historiador, tornou-se por pouco tempo ainda, porque morreu cedo, bem sucedido e premiado publicitário. Com sua viva inteligência, se daria bem em qualquer campo. Perda irreparável para a nossa memória histórica e nossos conhecimentos.

Manuel Mauricio, de melhor sorte, conseguiu ainda realizar uma primeira revisão na nossa historiografia, com sua pequena “Historia do Brasil”.

Lembro ainda nesta oportunidade o mestre e filósofo, Carlos Henrique Escobar, com obra em vários campos, líder da passeata dos cem mil que saiu do IFCS, preso e encapuçado, ele que é asmático. Por fim desistiu daqui, foi sobreviver em Portugal.


Não podia realmente esquecê-los, ao relembrar Milton Santos. Era uma turma de bons amigos e companheiros que se respeitavam como intelectuais, mutuamente.

Deixaram-me muito boas lembranças... e seus conhecimentos.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Jorge Cavalcanti de Albuquerque – uma revisão historiográfica. (c. de 1605 - 1695)

Jorge Cavalcanti de Albuquerque – uma revisão historiográfica. 
(c. de 1605 - 1695)
                 

            
 Ensaio 





Introdução

 

     A figura muito marcante de Jorge Cavalcanti de Albuquerque chama nossa atenção já nos primeiro capítulos do livro “A Fronda dos Mazombos”, livro de autoria do historiador Evaldo Cabral de Mello. E o autor nos faz acompanhar detidamente a atuação do turbulento personagem no fim do século XVII – promotor ele de contestações individuais contra as autoridades portugueses, por fim coordenador de motim popular precursor no ano de 1692 (1).
     
   
    Entretanto, a personalidade especial de Jorge Cavalcanti nos é apresentada por Cabral de Melo de forma algo deformada - como membro típico da “nobreza da terra” de comportamento abusivo e atrabiliário no período.  
     Cabral de Mello, ainda, irá repetir estas mesmas colocações sobre a “nobreza da terra” em seu recente livro “A Ferida de Narciso”, quando tece comentários críticos ao comportamento deste segmento social em Pernambuco no fim do século XVII, comentários realizados de forma acre e, mesmo, alegórica (2). 
    
   Ora, cremos necessário rever estas afirmativas de nosso historiador, não só as individualmente atribuídas a Jorge Cavalcanti, mas também as relativas de modo amplo à “nobreza da terra” em Pernambuco neste fim de século – colocações construídas sob uma ótica deformada, acreditamos, pelas inúmeras fontes portuguesas consultadas pelo autor.     
    
    Ao reler Cabral de Mello utilizando nossos próprios conhecimentos bem mais completos sobre a genealogia e a atuação política da família Cavalcanti de Albuquerque no século XVII, acreditamos poder passar a perceber a figura histórica de Jorge Cavalcanti por ângulos novos, ainda não percebidos por aquele historiador. 
   Ângulos que nos permitirão, até mesmo, ampliar a compreensão do termo “mazombo” (3).

    
      Consultando a listagem dos Cavalcanti de Albuquerque no século XVII, Jorge Cavalcanti nos é indicado por genealogistas tradicionais como sendo um dos últimos filhos de Antonio Cavalcanti de Albuquerque (c.1564-1640).     
    Jorge seria, portanto, neto do patriarca Filippo Cavalcanti (Florença, 1525 – Olinda, 1614), fidalgo de antiga família florentina e republicana que chegara a Pernambuco no século anterior e se casara com uma jovem mameluca da família dos Albuquerque, donos da capitania. Neste caso, Jorge Cavalcanti de tronco primogênito do florentino,  membro de família central da “nobreza da terra”, produtora e exportadora de açúcar em Pernambuco (4).
     Tentando reconstruir sua parentela, constatamos também que na juventude fora contemporâneo de seu muito influente sobrinho Antonio, cognominado o “da Guerra” (c. de 1608-1645), filho de sua irmã bem mais velha, Isabel (5).
     

    Em termos da ação política de sua família, acrescentamos que este seu sobrinho Antonio “da Guerra” se tornara, em meados do século XVII, figura preeminente na família e em nossa História -  o líder da “nobreza da terra” que defendera  a ideia de nova frente de guerra contra a ocupação holandesa, em socorro não só aos seus parentes Albuquerque Coelho, donos da capitania, mas também em apoio aos donos de engenho e colonos pernambucanos já muito sacrificados. Antonio fora um precursor “mazombo”, aquele primeiro nativista que morrera logo no início dos enfrentamentos da Restauração (1645) - os louros da vitória cabendo depois ao seu rival político, o representante da Coroa, João Fernandes Vieira (6). 
    Sabíamos, igualmente, que o quarto filho deste Antonio “da Guerra”, Lourenço Cavalcanti de Albuquerque, uma década do fim guerra holandesa dera sequência à liderança precocemente nativista de seu pai e da família Cavalcanti de Albuquerque. Em 1666, Lourenço chegou a participar decisivamente da deposição de um governador português, este sim atrabiliário - Jerônimo Furtado de Mendonça - em uma das primeiras ações especificamente nativistas no Brasil Colonial (7). 
   
    Lembramos que as dificuldades enfrentadas pela “nobreza da terra” no pós-guerra, em especial as econômicas derivadas da guerra contra os holandeses, não haviam sido absolutamente compreendidas pela Coroa, suspeitando-se à época que os holandeses se houvessem comportado melhor com a nobreza da colônia do que as próprias autoridades portuguesas e os mascates, em cujas mãos se encontrava, agora, uma nobreza sofrida e muito endividada. 
    Olinda nesta década estava ainda por reconstruir - o preço do açúcar em queda pela concorrência com o já produzido pelas Antilhas, grassando violenta epidemia de varíola entre os escravos. Além do mais, haviam sido criados tributos novos para o pagamento de indenizações aos holandeses, tributos que geravam ainda mais cobranças aos já inadimplentes, acompanhadas de apreensões das terras e mesmo de escravos dos senhores de engenho devedores (8).  
    
    Neste contexto de extremas dificuldades econômicas e prejuízos causados pelos esforços daquela guerra sustentada - tantas vidas cortadas, engenhos abandonados ao inimigo ou destruídos - a “nobreza da terra” se percebia, nas décadas seguintes, não só endividada aos mascates, mas já suspeita por atos de rebeldia pelas próprias autoridades coloniais portuguesas. 
   Exemplar do quadro descrito é o episódio histórico que registra, quase no final do século, o comportamento contestador de um outro membro da família Cavalcanti de Albuquerque – agora uma figura feminina, sobrinha de Jorge Cavalcanti - Isabel de Moura Cavalcanti. 
   
    Esta jovem senhora, filha de seu falecido irmão Felipe, em 1687 havia entrado em confronto com um comerciante português pela retomada do seu já histórico engenho, o “Bela Vista’, que fora deixado para trás ao inimigo holandês - ela e seu marido em consequência deste conflito rigorosamente punidos pelas autoridades portuguesas (9). 
    Adiante, no próprio texto, iremos detalhar este fato marcante, juntamente com outros, exemplares do período.  
      
     Reafirmando: a partir da leitura de “A Fronda dos Mazombos”, mas utilizando nossos próprios conhecimentos genealógicos e políticos sobre a atuação da família Cavalcanti de Albuquerque em Pernambuco neste século, conhecimentos registrados em nossos inúmeros artigos realizados com critério profissional (10), passamos a perceber as personalidades de Jorge Cavalcanti, e mesmo desta sua sobrinha Isabel de Moura Cavalcanti, agora sob um ângulo novo – ângulo não percebido por Cabral de Mello ou por nossa historiografia.  
    Perspectiva que privilegiando a atuação contestadora e nativista da família Cavalcanti de Albuquerque, no início liderada por Antonio “da Guerra” e depois por seu filho Lourenço –nos permite melhor compreender o comportamento aparentemente desesperado, mas reativo contra o dominador português por parte desta “nobreza da terra” pernambucana, já no fim do século XVII. 
    Esta perspectiva nova, acreditamos, pode vir a auxiliar a melhor compreensão do período que ainda vai se seguir, período já caracterizado mesmo pelos episódios dramáticos da “Guerra dos Mascates”.  
     
   A figura insubordinada de Jorge, analisada no contexto de seu quadro genealógico e sob a ótica da ação política contestadora dos parentes que o antecedem, será por nós percebida, agora, não mais como a de um nobre individualmente prepotente e atrabiliário – como Cabral de Mello nos havia apresentado e a “nobreza da terra” em geral naquela ocasião - mas um Jorge outro, personalidade longeva que atravessa o século e se demonstra como que um elo entre as gerações da família, ele certamente consciente das razões de sua insubordinação e das motivações maiores da sua ação - um consciente nativista, agindo algumas vezes de forma individual, quase desesperada e libertária contra as autoridades portuguesas.  
   À luz das ações também contestadoras anteriores de sua família tornam-se nítidos para nós os motivos pelas quais, neste fim do século XVII, Jorge Cavalcanti tomara também para si, por vezes até mesmo individualmente como sua sobrinha Isabel, os encargos políticos e contestadores maiores de sua família contra a Coroa. 
   
    Se Jorge Cavalcanti havia agido de início contestando autoridades portuguesas em concurso com a Câmara de Olinda, ele havia sido preso pela primeira vez, já idoso, por uma ação sua eminentemente individual no começo do governo do Marques de Montebelo, tentando negar às autoridades a entrega de um escravo seu incriminado (11).  
    Idoso e desafiador, mesmo tendo sido preso, Jorge continuou tramando nos bastidores, coordenando depois com seu decidido sobrinho-bisneto - Cosme Bezerra Monteiro, um neto do “da Guerra” – amplo levante popular que eclode em 1692, e que tem como pretexto o fato da capitania passar às mãos do marques de Caiscais (12).  
    
    Naquela ocasião, surgem no próprio interior da família Cavalcanti de Albuquerque as primeiras suspeitas de que Jorge não fosse mais um vassalo de “el Rei” (13). 
    Dois anos depois, Jorge Cavalcanti será mais uma vez preso pelas autoridades portuguesas, aparentemente  por motivos pessoais - a pretexto de uma vindita contra um tabelião reinol, vindita tida como abusiva.  Seu filho Antonio, igualmente, detido na ocasião (14).
     Mas, pelo agravante de pertencer a uma família já marcada por um histórico de insubmissão frente às autoridades portuguesas, Jorge Cavalcanti só poderia mesmo terminar seus dias, como realmente terminou, na cadeia.
     
   Notamos que mais adiante, seu outro filho do mesmo nome Jorge, na passagem do século, dará continuidade ao processo contestador da família, atuando agora de forma muito solidária e coordenada com inúmeros outros membros da família Cavalcanti de Albuquerque, ramos de Holanda Cavalcanti, decididos Bezerra Cavalcanti e indignados Falcão Eça, ainda outras importantes famílias pernambucanas, em ações francamente sediciosas da “Guerra contra os Mascates’ de 1710. E, a que tudo indica, a última prisão deste segundo Jorge, o II, poderá ter ocorrido em condições ainda  mais ultrajantes que a prisão de seu pai - com os demais fidalgos e rebeldes mantido nas masmorras das Cinco Pontas, embarcados em gaiolas sob grilhões e ferros esperando seguirem para julgamento na Corte de Lisboa (15). 
   
 

     A partir da compreensão do um amplo contexto histórico e, sobretudo, levando em conta as propostas políticas nativistas que a família Cavalcanti de Albuquerque especialmente conduziu, propostas que vinham especialmente sendo gestadas a partir da ação de Antonio “da Guerra”, os confrontos políticos liderados por Jorge Cavalcanti I na segunda metade do século XVII nos aparecem, agora, como bem típicos de um comportamento propositadamente contestador e “mazombo”, comportamento embebido, sobretudo, pela qualidade muito específica, insubmissa e “sdegnosa”, sempre crítica aos governos prepotentes, típica dos Cavalcanti (16) – Jorge já seguro e plenamente consciente dos seus direitos à terra natal construída e ainda reconquistada aos invasores holandeses.

     


    Desenvolvimento 
        
      Explicitadas as premissas iniciais deste artigo,  pretendemos nesta parte do trabalho detalhar os vários episódios contestadores referidos nos quais a família Cavalcanti de Albuquerque atua como líder da “nobreza da terra” no fim do século XVII, visando confirmar o proposto.  
   Temos em vista não só compreender melhor a personalidade de nosso Jorge Cavalcanti, como aprofundar de forma ainda mais sistemática o comportamento de sua família, comportamento que temos como típico de uma “nobreza da terra” no período.  
    Para facilitar o leitor, o contexto social, político e econômico de época ainda mais ampliado e colocado por vezes em notas, para mais fácil acompanhamento da ação política das figuras históricas referidas no texto.  
      
    Relembramos que, nos capítulos iniciais do livro de Cabral de Mello “A Fronda dos Mazombos”, Jorge Cavalcanti nos fora apresentado como um prepotente, um insubordinado promotor de rebeldias contra as autoridades portuguesas – percebido por nosso historiador, de modo limitado e circunscrito à ótica portuguesa da época, como exemplar de uma “nobreza da terra” particularmente abusiva e atrabiliária no período (17).  
   Tentaremos enfocá-lo, agora, de modo novo e mais completo - as colocações de Cabral de Mello, não só as individualmente atribuídas a Jorge, mas também as relativas à “nobreza da terra” em Pernambuco no período, apresentadas de forma nova, mais contextualizada e ampliada.     
    
   Repetimos:
      O segmento social da “nobreza da terra”, segmento mais expressivo na produção de açúcar em Pernambuco, sofria no fim de século, além da expoliação econômica típica do modelo colonial ultramarino português, o agravamento de sua situação pelas dívidas advindas da luta contra os holandeses, guerra que este segmento havia liderado e sustentado com grandes prejuízos em vidas e bens - engenhos destruídos ou deixados para trás -  a despeito mesmo das muitas protelações e indecisões da coroa. 
   Ao fim da guerra, alem de dificuldade especificas acima comentadas - destruição de Olinda, baixa do preço do açúcar, epidemias sofridas pela escravatura – esta “nobreza da terra” se percebia em especial desmoralizada por uma mascatearia enriquecida de forma oportunista e que lhe cobrava juros extorsivos. Sobretudo espoliada pelas autoridades portuguesas que lhes cobravam novos impostos para indenizar os holandeses, impostos que acabavam por despoja-los de suas propriedades e posses.  
    Por fim, este segmento da “nobreza da terra” percebia-se, até mesmo, desprestigiado pelas próprias autoridades portuguesas, que dela já desconfiava em virtude de seus primeiros atos de rebeldia (18). 

    Para análise destes primeiros atos de insubordinação da “nobreza da terra” devemos voltar, ainda que de modo algo resumido, à atuação nativista de Antonio “da Guerra” nos meados do século em Pernambuco para podermos entender melhor este nosso Jorge Cavalcanti e a situação desta “nobreza da terra” já rebelde, extremamente contestadora alguns anos mais tarde.
     
     Recordamos que fontes antigas, oitocentistas e mesmo modernas, reiteram que Antonio Cavalcanti de Albuquerque, “o da Guerra”, sobrinho e contemporâneo de Jorge Cavalcanti I, foi um dos primeiros a opor-se ao armistício vigente na Colônia em relação aos holandeses - o rompimento deste armistício sentido como uma necessidade imperiosa para os pernambucanos da capitania a partir de 1640 (19). 
     No entendimento da atuação política de Antonio Cavalcanti de Albuquerque, “o da Guerra” da Restauração, encontraremos a origem mesmo do sentimento consciente de nativismo, melhor dizendo, a origem do sentimento consciente de “brasilidade” - pois Antonio foi reconhecido tacitamente, por nossa historiografia clássica e moderna, como o idealizador e o líder “da terra” no movimento contra a ocupação holandesa na capitania, movimento que de início contou, para sua própria deflagração, com tropas organizadas e compostas pela “nobreza da terra”,  apoiadas por outros donos de engenho e colonos luso-brasileiros que se viam em perigo constante, ainda auxiliados por decididas tropas de escravos negros com promessas de liberdade e  experientes tropas indígenas lideradas pelo cristianizado Camarão (20). Lembramos que Antonio Cavalcanti, representando a “nobreza da terra” e João Fernandes Vieira, um reinol oportunisticamente enriquecido e escolhido como representante da Coroa, em junho de 1645 haviam chegado mesmo a ameaçar o governo de holandês com a mobilização de 20.000 homens brancos e 30.000 negros e mestiços, para uma guerra total (21).
     Antonio Cavalcanti, o “da Guerra”, foi considerado o mais legítimo “mazombo”, o primeiro que se levantara na luta da Restauração contra os holandeses, mas que, falecendo de modo não bem explicado logo no começo dos conflitos em 1646, possibilitou que o reinol João Fernandes Vieira, o representante português, levasse por fim os louros e as vantagens da vitória (22). 
    Antes mesmo de começada a luta, no ano 1646, em verdade já ambos divergiam e disputavam a liderança no interior do movimento “Restaurador” - liderança do reinol ou a da “nobreza da terra”, divergências já com repercussões na própria condução da guerra. Mas, com a morte precoce e suspeita de Antonio, em setembro de 1646, no começo dos enfrentamentos, a vitória conseguida sobre os holandeses será mais tarde creditada, pela historiografia oficial, especialmente à Vieira e aos portugueses. 
    Assim sendo, na perspectiva da família Cavalcanti de Albuquerque a consolidação da liderança de Vieira, um reinol, prejudicara o avanço do processo nativista de independência - processo almejado não só por Antonio Cavalcanti, a que tudo indica também já  por setores bem mais amplos, setores na Colônia que ultrapassavam o segmento da “nobreza da terra”, como afirmamos acima e ficara patente durante o processo de luta (23). 
      
   Mas acreditamos que as propostas políticas de Antonio “da Guerra”, nativistas e precocemente libertadoras, não estiveram de todo perdidas com sua morte prematura e a consequente fama adquirida por Vieira. 
     A nossos ver, os ideais nativistas de Antonio “da Guerra” continuaram socialmente latentes e, pouco depois do fim da guerra holandesa levados adiante pela liderança da própria família Cavalcanti de Albuquerque, em especial por seu quarto filho Lourenço Cavalcanti de Albuquerque e pela prima Isabel de Moura Cavalcanti - bandeira retomada no fim do século por este seu tio Jorge Cavalcanti e gerações seguintes de Cavalcanti de Albuquerque e Bezerra Cavalcanti. 
  

    Acrescentamos detalhadamente:
    Com o fim da guerra holandesa e o agravamento da situação econômica da “nobreza da terra”, no ano de 1666 em Pernambuco, Lourenço Cavalcanti, o quarto filho de Antonio da Guerra dará continuidade a atividade política nativista de seu pai participando de conspiração para a própria destituição do governador português à época, este sim, tido pelos pernambucanos como extremamente atrabiliário - Jerônimo Mendonça Furtado. Lourenço Cavalcanti de Albuquerque agiu com a colaboração decidida, entre outros, de André de Barros Rego e membros da Câmara de Olinda.   
     A chamada “Conjuração do Nosso Pai”, em agosto daquele ano, destituiu violentamente este governador tido como autoridade sem caráter, que “executava dívidas, sequestrava bens, em especial dos engenhos e partidos de cana, prendia e soltava, tudo em troca de dinheiro...”. Mendonça Furtado foi detido à mão armada por Lourenço Cavalcanti e André de Barros Rego ao sair de uma Igreja e enviado para uma enxovia da fortaleza do Brum no Recife.   
    Mas em hábil manobra da Coroa o governador foi logo substituído pelo prestigiado herói militar  André Vidal de Negreiros, natural da Paraíba, que já havia articulado brilhantemente os interesses portugueses com os das forças “da terra” na luta contra os holandeses e, depois da guerra, exercido o cargo de governador por um período - personalidade capaz de apaziguar temporariamente os ânimos em Pernambuco.    
    A “Conjuração do Nosso Pai”, entretanto, ainda hoje é considerada pela nossa historiografia como um dos primeiros movimentos nativistas do Brasil Colonial (24).  
     
     Confirmando, mais uma vez, o importante papel contestador dos Cavalcanti de Albuquerque em Pernambuco, em contexto cada vez mais agravado pelo endividamento da nobreza frente aos mascates, chamamos ainda a atenção do leitor para o episódio que tem a participação quase desesperada da nossa já referida Isabel de Moura ou Isabel Cavalcanti nesta geração, fim do século XVII (1687), quase vinte anos depois da ocorrência da “Conjuração do nosso Pai" em que Lourenço Cavalcanti, filho do “da Guerra”, se envolvera contra o governador português.  
    Episódio muito interessante e sugestivo de rebeldia que comprova a continuidade da trajetória contestadora da família Cavalcanti de Albuquerque, agora por uma decidida figura feminina agindo de forma dramática, individual e anárquica.
    
     Isabel era já bisneta do florentino e admitimos sobrinha do nosso Jorge Cavalcanti I - filha do seu irmão bem mais velho Felipe Cavalcanti de Albuquerque (c.1596-1657), lutador na guerra holandesa que migrara para a Bahia, mas retornara à Pernambuco ao fim da guerra e já havia falecido (25).  
      Por volta de 1687 a jovem Isabel havia perdido a posse do histórico engenho que fora de sua respeitável avó materna, D. Isabel de Moura - o “Boa Vista”. Este engenho tinha já um passado histórico e simbólico, pois havia sido abandonado aos holandeses na retirada da família para a Bahia e, por dívidas, Isabel mais tarde não o pode retomar, o “Boa Vista” leiloado ao comerciante reinol Roque Gomes Paes (26). 
    Lembramos que cinquenta anos antes, em julho de 1635, as forças coloniais resistentes haviam tido severas perdas com o avanço de forças holandesas invasoras e obrigadas a evacuar o vilarejo Vila Nova do Serinhaém, ultimo refúgio da população civil. Nesta ocasião D. Isabel de Moura, senhora de engenho respeitada e já viúva do herói Antonio Ribeiro de Lacerda, havia se juntado à população civil que fugia de Serinhaém, tendo que deixar para trás este seu engenho “BoaVista”. D. Isabel era filha de D. Felippe de Moura, sobrinho do patriarca Jerônimo de Albuquerque e também da notável D. Brides, a proprietária e fundadora da capitania. Entretanto, juntamente com a população e os que puderam, D. Isabel empreendeu esta dura retirada épica, perseguidos e lutando com os holandeses em direção à Bahia (27). 
      Agora, com o fim da guerra e o retorno dos herdeiros, o engenho “Boa Vista” fora leiloado.  Por ocasião do despejo da família realizado à força armada, haviam sido entoadas cantigas à viola debochando da uma indignada neta Isabel Cavalcanti, o marido criticado pelo comerciante arrematador, de forma agressiva, como um “fidalgo de borra”. No processo que se segue é comentado que Isabel, extremamente ofendida pelo comerciante, teria se negado depois a compartilhar o leito conjugal (28).      
    Acreditamos que a jovem senhora deve ter se sentido humilhada frente a estas palavras públicas tão rudes, sentindo-se certamente desprestigiada pelas autoridades portuguesas em sua luta pela posse do engenho, ela portadora ainda de fortes sentimentos ligados à honra e dignidade, característica da mentalidade feudal e certamente de sua família.  
      Em consequência, seu marido, Leão Falcão de Mello, membro igualmente de uma família de heróis da guerra holandesa, será pouco depois culpado pelas autoridades portuguesas pela morte de Roque Gomes Paes, numa emboscada. Detido, Falcão de Mello acaba morrendo na prisão, tendo Isabel que fugir para o interior.  
      O irmão do marido, Pedro Marinho Falcão, pelo mesmo motivo será preso, enviado para julgamento não sabemos se na Bahia ou em Lisboa (29).     
     
    O abandono do engenho histórico “Boa Vista” ao inimigo holandês e o posterior leilão a um reinol, a que tudo indica, terá sérias consequências - não só na vida da sofrida Isabel, mas consequências também importantes na vida de gerações seguintes de Cavalcanti de Albuquerque e Falcão Marinho, como observaremos, ainda décadas depois indignados por estes acontecimentos (30). 
    
    No fim dos anos seiscentos, num contexto cada vez mais agravado por divergências da nobreza com autoridades portuguesas e mascates, a ação do cada vez mais indignada de Jorge Cavalcanti dará prosseguimento às contestações familiares, agindo agora de forma ainda mais exacerbada contra as autoridades portuguesas e, como a de sua sobrinha Isabel, apresentando características pessoais quase libertárias, talvez mesmo anárquicas, no mínimo “sdegnosas” - marca já tradicional da ação política de sua família em Florença (31), família que em Pernambuco demonstrava ainda sua pertinácia política. 
     Seguindo o exemplo familiar do determinado sobrinho Antonio “da Guerra”, do sobrinho-neto Lourenço e a desesperada Isabel Cavalcanti, Jorge Cavalcanti vai se demonstrar também portador das tendências insubmissas características dos Cavalcanti – tornando –se, a nosso ver, um “mazombo” ainda mais seguro e consciente frente ás autoridade portuguesas dos seus direitos à terra defendida, por sua família e pelos pernambucanos, aos holandeses. 
     
   Inicialmente, a ação política rebelde de Jorge, sabemos, havia se limitado ao apoio a interesses da “nobreza da terra” como juiz ordinário da Câmara de Goiana, agindo com a Câmara de Olinda contra a malvista presença da figura do desembargador corregedor, figura usual desde os anos 70 e cuja presença, alegavam, prejudicava a paz da capitania e o bolso dos moradores (32). 
      Entretanto, um fato ainda marcante pode ter se tornado decisivo na sua forma muitas vezes individual de atuar, pois as punições de sua sobrinha Isabel e seu marido em 1687 quase se haviam renovado na família com a prisão do seu jovem sobrinho neto Lourenço Cavalcanti Uchoa, filho de Lourenço, em 1691.  
    
    Em 1691 este jovem neto do “da Guerra”, Lourenço Cavalcanti Uchoa, por questionar na Câmara com o companheiro João Barros Rego contra novas taxações de vinho e carne foram ambos presos pelo governador português Marques de Montebelo e enviados para enxovias de fortalezas distintas. 
    Uchoa e João Barros Rego foram comprometidos, sobretudo, pelas ações contestadoras anteriores de seus pais que, lembramos, haviam enviado o governador Furtado de Mendonça para a enxovia da fortaleza do Brum – ambos, ainda de forma mais severa, ameaçados por Montebelo de serem mandados para julgamento em Portugal, sendo apenas liberados por intervenção do bispo e outras figuras de nomeada (33). 
      
       Notamos que a partir desta ocasião, a ação contestatória de Jorge parece se tornar, ainda mais intensa e decidida. 
        É possível que a ação contestadora sistemática de Jorge Cavalcanti de Albuquerque, especialmente ao final da vida, tenha sido desencadeada por estas violentas ações das autoridades portuguesas contra estes seus dois sobrinhos, Isabel e o jovem Lourenço Uchoa - pois na década de 90 Jorge estará atuando de modo determinado e extremado, já bem idoso entre 1690 e 92, contra o governo de Montebelo.          

                          
                           O historiador Evaldo Cabral de Mello chega a afirmar, sem compreender muito bem as razões de tanta rebeldia ou mesmo conseguir explicar a dinâmica desses fatos:
                         “Já nesses anos de governo de Montebelo, a rivalidade entre os nobres e em especial os Cavalcanti, de um lado, e os mascates do outro, nada fica a dever na intensidade dos rancores à que dividia Pernambuco” (34).

                         Neste governo de Montebelo, Jorge Cavalcanti desafiador foi pela primeira vez preso por tentar arrancar, com seu genro e um séquito de trinta homens, um seu escravo incriminado das mãos das autoridades portuguesas, em Goiana. Solto apenas por interferência de parentes e amigos (35).                          
                        E, mesmo já tendo sido preso, continuou Jorge Cavalcanti ainda atuando nos bastidores como o coordenador de um amplo levante popular que por fim eclode em agosto de 1692, em Goiana. 

    No episódio simbólico deste levante contra o governador Montebelo, a ação de Jorge se fez na companhia do um sobrinho-bisneto rebelado, Cosme Bezerra Monteiro – um dos netos do “da Guerra”, cuja mãe havia se casado na também aguerrida família dos Bezerra Monteiro. Atuavam eles agora com o apoio da Câmara e de carmelitas de Goiana, ainda outros populares.  No relato de época, transcrito de Cabral de Mello, eram “... mais de mil pessoas com armas, dispostas a pelejar formados. E tem o povo a um juiz e dois vereadores presos e a Jerônimo Cavalcanti com sentinelas a vista” (36). 
    Os rebelados por quase uma semana tentaram impedir a entrega da capitania de Itamaracá ao representante do marques de Caiscais e protestaram armados durante o levante, alegando em alto e bom som que Itamaracá só reconhecia “por senhor a El Rei, já que se havia restaurado do jugo holandês sem auxilio dos donatários” (37).
     Este levante popular que Jorge Cavalcanti articulou e liderou constitui episódio importante em nossa historiografia, pois antecede mesmo a “fronda” da nobreza da terra de 1710.
     Seu outro sobrinho, Jerônimo Cavalcanti de Albuquerque Lacerda, outro filho de seu irmão Felipe e então capitão mor de Itamaracá – que fora, como já observamos, a mando de seu tio Jorge detido na ocasião – chegará a expressar depois por carta a D. Pedro II suas duvidas de que Jorge fosse ainda um vassalo de El Rei (38).  
     
     Apenas dois anos depois deste levante que mobilizara a população e mesmo com as promessas paliativas da coroa de proteger e prestigiar a “nobreza”– o provocativo e aparentemente destemperado Jorge será, novamente, preso.   
    
    Nesta ocasião, 1594, fontes portuguesas queixosas diziam contra Jorge que ele acintosamente impedia a execução de ordens regias, intimidava oficiais de justiça para não cumprirem diligências contra os “da terra”, tabeliões para que delitos não fossem punidos – “pretendia” mesmo ser o senhor da capitania. Enfurecido referia-se ao rei como um tirano, e como que vivos ainda os holandeses.
     A que tudo indica, nesta ocasião, até mesmo alguns membros da sua própria família - temerosos das represálias reais que já haviam se abatido sobre eles - nesta difícil situação defendiam o exílio de Jorge (39). 
   
    Mas o pretexto das autoridades portuguesas para prendê-lo, finalmente, em 1694 foi uma vindita de Jorge contra um tabelião, tido por fontes portuguesas como figura respeitável.   Com certeza seria tabelião que agia em contradição com seus interesses ou da “nobreza da terra”, um desafeto seu, pois a surra foi aplicada por seus escravos e por seu próprio filho Antonio, correção curiosamente ocorrida na frente de um convento, a luz do dia e em rua de movimento (40). 
       Bem idoso - com quase oitenta anos em 1695 - enquanto esperava o ouvidor da Bahia designado pelo rei português para julgar seu caso com o rigor da lei, Jorge acabou mesmo morrendo na cadeia. Com sua morte, ao ouvidor de Pernambuco coube então prender e julgar, apenas, o seu filho Antonio (41).  
    
    
      Retomando o fio da meada: 
      Nos meados do século, com o fim da luta contra os holandeses e a morte precoce e suspeita de Antonio Cavalcanti, “o da Guerra”, os ideais políticos nativistas e libertários dos Cavalcanti de Albuquerque e dos pernambucanos haviam sido levados adiante sucessivamente, neste final do século XVII, por seu filho Lourenço Cavalcanti, pela desesperada sobrinha Isabel, pelo jovem neto Cavalcanti Uchoa, por seu idoso e indignado tio Jorge Cavalcanti, ainda em especial pelo ramo Bezerra Cavalcanti descendente de sua filha Leonarda. 
    Assim sendo, acabam os descendentes de Antonio Cavalcanti de Albuquerque, “o da Guerra”, por liderar já em novembro de 1710 um geral, muito amplo e indignado levante da “nobreza da terra”, uma “fronda”, atuando com populares contra as autoridades portuguesas e mascates em Pernambuco, primeiro episódio da chamada “Guerra contra os Mascates”.     
    Este episódio rebelde de longa duração convulsionará por quatro anos a capitania, mobilizando outras famílias da “nobreza da terra”, colonos pernambucanos, alem de segmentos indígenas - episódio com nítidas tendências nativistas e mesmo libertárias e, a que tudo indica, com os primeiros laivos, até mesmo, do republicanismo característico da família (42).  

    Desta “Guerra contra os Mascates” participará igualmente um dos filhos de Jorge Cavalcanti, de mesmo nome Jorge, sargento-mor das milícias de Goiana, além de seus numerosos sobrinhos-bisnetos, do ramo Monteiro Bezerra Cavalcanti. 
   Jorge II, nesta ocasião, será incentivado para a rebeldia por seu próprio sogro, Francisco de Barros Falcão, daquela família também atuante na guerra holandesa e ligada por casamento aos Cavalcanti de Albuquerque desde o drama da jovem Isabel, todos juntos mobilizados contra os mascates e, agora, contra o governador português Castro Caldas. 
   Jorge II foi detido já na gestão governador português Felix Machado e, a que tudo indica, teria sido uma segunda vez preso, enviado para as masmorras da fortaleza das Cinco Pontas - neste caso teria ele sido ameaçado, com outros rebeldes, de ser embarcado para a prisão do Limoeiro, em Lisboa - obrigado a subir a bordo em gaiolas, sob ferros, quando a tempo muitos desses presos acabaram por receber o perdão da Coroa (1714).  
    Nestas circunstâncias Jorge Cavalcanti II, teria se negado a receber este tardio perdão real, pois eram mantidas as punições aos seus parentes do clã Bezerra Cavalcanti – que de forma muito humilhante foram, por fim, embarcados para julgamento e martírio em Portugal. (43). 
      

      Assunto relacionado aos tipos de punições humilhantes da época, não podemos deixar de comentar episódio curioso que envolve ainda nosso Jorge Cavalcanti de Albuquerque I, episódio, a que tudo indica, típico de mentalidade ainda medieval.     
      Evaldo Cabral de Mello refere-se a um tipo de punição, interpretado por fonte portuguesa como indicativo do “sadismo” de Jorge: o corte da barbicha de um homem modesto - talvez um esmolante, que o tenha desconsiderado (44). Observamos que nesta mesma obra, Cabral de Mello refere-se também “ao corte da barba e das cãs” de um desafeto idoso dos Cavalcanti durante o episódio mais violento da guerra contra os mascates, o saque de Goiana (45). 
   Seriam estes castigos contra desafetos políticos idosos característicos de época, e da atuação dos Cavalcanti - vindos de seu longo passado de governança florentina e feudal, ainda não conhecidos das práticas portugueses? Não sabemos responder, mas acrescentamos que tanto os Albuquerque como os Cavalcanti, de muito longa trajetória de governança, traziam malícias e práticas muito antigas no trato político com seus inimigos políticos, algumas delas comentadas pelo próprio Evaldo nesta mesma obra, como o uso do cacete pelos portugueses e as manipulações políticas por alianças matrimoniais, por nós comentadas no nosso livreto “Família Cavalcanti de Albuquerque” (46).    
   Em Florença, Cosme I de Médici aplicara aos nobres idosos rebelados em Montemurlo (1535) castigos de época igualmente humilhantes – nobres idosos obrigados a desfilar descompostos, montados em animais trôpegos, ao entrar em Florença. A escritora Maria Cristina C. de A. em seu romance “O Magnificat”, sem citar suas fontes, relata o severo castigo infringido desta vez pelos mascates ao líder “mazombo” João Rego Barros, idoso e nobre obrigado a teria ter de desfilar em ferros, em condições para ele extremamente aviltantes, ao entrar em Recife. (47). 
      


Conclusão 


     Do acima afirmado, pensamos necessário reavaliar a personalidade de Jorge Cavalcanti dentro do contexto histórico peculiar, contexto que leve em conta não só as características econômicas de um período de exacerbada espoliação colonial, mas também as condições sociais e ideológicas, com mentalidade típica de época, período de transição, ainda marcado por fortes valores medievais.  Contexto, sobretudo, em que sua família da “nobreza da terra” já atuava em sentido precursoramente nativista como liderança, fato constatado pelo menos desde a ação de Antonio “da Guerra” (48). 
    A nosso ver, Jorge Cavalcanti dava sequencia ao movimento de contestação consciente e sistemático iniciado por seu sobrinho Antonio, atuando seja de forma individual ou limitado ao núcleo familiar, seja de caráter articulado e mais amplo, coordenando outras famílias da “nobreza da terra”, ainda outros segmentos sociais – ação contestadora que se mantém especialmente no interior da família Cavalcanti de Albuquerque em Pernambuco, de forma continuada, sem quebra geracional durante largo período. 

    Esta liderança contestadora e libertária dos Cavalcanti de Albuquerque, liderança herdada por fortes ligações de parentesco com os Albuquerque Coelho proprietários da capitania, se manifestava desde a ação de Antonio “da Guerra” na Guerra da Restauração.  Liderança contestadora que os Lourenço, filho e neto, o tio Jorge, a jovem Isabel de Moura, ainda Jorge II e os Bezerra Cavalcanti deram continuidade até o fim do século XVII, começo do XVIII, liderança que se demonstrou, de forma especialmente nítida no levante nativista amplo da “Guerra contra os Mascates”, quando esta família parece manifestar suas simpatias, até mesmo, por ideais precoces de republicanismo (49).    
    
     No episódio marcante da “Guerra conta os Mascates” de 1710, verdadeiro levante da “nobreza da terra” contra a coroa, uma “fronda”, em especial a descendência do florentino, por seu filho primogênito Antonio, os netos Felipe e Jorge Cavalcanti - linha propriamente Cavalcanti de Albuquerque – igualmente pela neta Isabel Cavalcanti, mãe do “da Guerra”, matriarca do clã Bezerra Cavalcanti - deixará marcas históricas indeléveis, precursoras de brasilidade (50).       







Notas 

 (1) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos Cia. das Letras, 1995, capítulo 2, “Atribulações do marquês de Montebelo”.
(2) A utilização do conceito de “nobreza da terra” para o segmento social em causa, no nordeste no Brasil no século XVII, é por nós explicitado e já discutido na introdução do nosso trabalho “Antonio Cavalcanti de Albuquerque, o da Guerra”, Prefácio, não publicado, mas aberto a consultas.   A nosso ver, este conceito é especialmente operativo para o fim do século XVII, e é também utilizado por nós no artigo “O ramo Bezerra Cavalcanti na Guerra contra os Mascates”, igualmente já aberto a consultas.  
    Absolutamente não concordamos com as conclusões defendidas pelo historiador Evaldo Cabral de Mello em seu livro A Ferida de Narciso (Ed. SENAC 2001, pg.44) - obra em que este autor parece se demonstrar limitado, como de resto o escritor Viana Moog, à predominância ainda de sentimentos de ressentimento no conceito de “mazombo”, conceito utilizado por nossa historiografia para a segunda metade do século XVII (ver sobre a critica à Viana Moog nosso trabalho “Mazombo”).  
    Se o reconhecimento e condicionamentos de titularidade da “nobreza da terra” viriam tardiamente, em 1730 - assim mesmo para dirimir os conflitos ocorridos no passado recente – o segmento social da “nobreza da terra”, para Cabral de Mello, durante o segundo quartel dos anos seiscentos e consequentemente na Guerra dos Mascates, seria vítima de uma “ferida narcísica” agindo como um louco, um “Napoleão de hospício” (ver especialmente seus comentários na pg. 83 do livro acima citado). Também em A Fronda dos Mazombos, citada, pag. 142 quando afirma: “No plano ideológico, a nobreza reagirá ao desafio mascatal com um ressentimento que beirou por vezes a paranoia de classe”. 
    No nosso ponto de vista, Cabral de Mello teria ainda dificuldade em perceber mais nitidamente, ao utilizar e interpretar ainda tantas fontes portuguesas, que há muito já se gestava e conscientemente se preparava em Pernambuco os ideais de independência - ideais que só serão claramente expostos a partir de 1710, mas que já se haviam gestado bem antes e se manifestado conscientemente no segundo momento da luta contra os holandeses, como constatamos em nosso trabalho Antonio Cavalcanti, “o da Guerra”, aberto pesquisas.  A respeito da geração de um nativismo ainda mais precoce, consultar o livro recente de Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina – Matias, Bagaço, Recife, 2012.
    Assunto retomado adiante no “Desenvolvimento” deste trabalho.  
 (3) “Mazombo” – palavra de origem africana significando tristonho, taciturno, sorumbático, carrancudo, macambúzio, mal humorado. Adjetivo utilizado pelos portugueses para qualificar o filho de português nascido na Colônia – o que se sentia insatisfeito com a vida que levava, mas não merecia. 
    "Complexo de mazombo" - expressão introduzida pela crítica literária para melhor entendimento, na Bahia, da obra poética de Gregório de Mattos (1636-1695) - expressão que descreve a forma eminentemente crítica deste autor ver o mundo colonial. 
    Sobre a discussão do conceito de mazombo Torres, Rosa Sampaio, artigo “Mazombo”, no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br. 
    Mais explicações no decorrer do texto.  
 (4) Temos com fonte principal para esta genealogia Bittencourt, Adalzira - Genealogia dos Albuquerques e Cavalcantis, Rio de Janeiro, Livros de Portugal S/A, 1965, pág. 292, 293. A autora transcreve lista corrigida do genealogista Carlos Xavier de Brito e afirma: “entre os filhos de Antonio também é citado Jorge [Cavalcanti] de Albuquerque”. Antonio, o segundo filho do florentino Filippo Cavalcanti é indicado pela autora como casado com Isabel de Góis, a filha de Arnao de Holanda e Brites Vasconcellos. A autora não diz por quem Jorge é citado como filho de Antonio.  Infere-se, porém, seja o genealogista Carlos Xavier de Brito, cuja lista a autora transcreve. Segundo ela, Carlos Xavier de Brito relacionou os filhos de Antonio baseado em listagens de Jaboatão e Borges da Fonseca. 
      Nesta mesma listagem, o primeiro filho do florentino seria em verdade João, referido apenas como falecido em criança.
     A data de nascimento do filho do florentino, Antonio, é calculada por nós no artigo               “Antonio Cavalcanti de Albuquerque – o “da Guerra” Holandesa”, nota 12, ainda não editado, mas aberto para pesquisa. 
 (5) A data aproximada do nascimento de Jorge Cavalcanti é calculada por nós a partir da lista da família Cavalcanti de Albuquerque referida por Bittencourt, Adalzira – opus cit., pág. 292, 293, informações cruzadas com as de Barata - Carlos Almeida & Bueno, Antonio Henrique Cunha - Dicionário das Famílias Brasileiras, Ibero-América, 1999, verbete Cavalcanti, que fornece a data de nascimento de Felipe Cavalcanti de Albuquerque, o quarto irmão de Jorge em c.1596 - falecido em 1657, em Ipojuca. 
     Jorge, citado por Bittencourt, poderia estar está situado entre os últimos dos 13 filhos de Antonio, o filho do florentino - e neste caso (1596 + 9 aproximadamente) seu nascimento pode ter ocorrido depois ou próximo de 1605. 
   A morte Jorge de Albuquerque teria ocorrido em 1695 (Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87, nota 94, data inferida das cartas enviadas a D. Pedro II em 1695, todas em AHU, PA, Pco, cx 11). Se nossos cálculos estão corretos Jorge teria morrido com mais de oitenta anos, o que nos parece bem provável, pois sua morte é dada como ele já idoso.  
     A irmã de Jorge, Isabel, mãe de Antonio “da Guerra” é referida como nascida em 1583 ou 1590, e seu filho Antonio “da Guerra” nascido possivelmente cerca de 1608 (fonte um fichier de Guy Spillbeen - 51, mídia eletrônica, sem entretanto referir  fontes), falecido ainda jovem no ano conhecido de 1645 (Gonçalves de Mello, JFV. Pg. 178 nota 33, fonte frei Calado e Jornal de Arnhem). 
      Neste caso, o tio Jorge (n. c. 1605) seria mesmo contemporâneo de seu sobrinho Antonio “da Guerra” (n. c. 1608).  
(6) Sobre Antonio Cavalcanti, o “da Guerra” da Restauração, que lutou contra a ocupação holandesa ver abaixo no texto, parte “Desenvolvimento”. 
      Sobre ele consultar especialmente a obra de Cabral de Mello, Evaldo - Rubro Veio, Topbooks, 1997, capítulo “O panteão restaurador”. Também Torres, Rosa Sampaio - artigo “Antonio Cavalcanti de Albuquerque”, já aberto a consultas. Ainda da mesma autora e no mesmo blog o recentemente publicado “A família Cavalcanti e os ideais republicanos no período Colonial”.   
     Mais sobre a psicologia e possível origem remota dos ideais nativistas dos “sdegnosos” Cavalcanti de Albuquerque na nota 16 e, sobre Antonio “da Guerra”, mais bibliografia na nota 19. 
(7) O episódio historicamente denominado “Conspiração do nosso Pai” é analisado por Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, opus cit., capítulo “O agosto de Xumbergas”, citando várias fontes. 
    Ver mais no texto a seguir, parte “Desenvolvimento”, especialmente nota 24, com novas informações e outras fontes.
 (8) Lembramos, a Câmara de Recife em 1673 externava que há dezenove anos os holandeses haviam sido expulsos sem que os moradores experimentassem o alívio que esperavam dos tributos cobrados pela Coroa. 
   Evaldo Cabral de Mello em A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 38/39, relata a dramática situação fiscal dos pernambucanos e lembra a cobrança de novos impostos: “A esta conjuntura bastante sombria [pela morte dos escravos que provocavam prejuízos consideráveis na Colonia] ajuntavam-se as seqüelas fiscais do chamado “donativo da rainha da Grã-Bretanha e paz de Holanda”... O novo imposto devia arrecadar 6 milhões de cruzados, tocando Pernambuco contribuir com 140 mil cruzados anuais pelo espaço de dezeseis anos, dos quais 23 mil corresponderiam á cota de Pernambuco e capitanias vizinhas”. Fonte Gonçalves de Mello, J. A. – “As Consequências fiscais do chamado donativo para o casamento da rainha da Grã-Bretanha e da Paz da Holanda (1664-1666)”, RIAP, 54 (1981), pg.9-11. 
    As pressões exercidas para cobrança deste novo imposto pelos governadores portugueses foram então dramáticas, com a tomada de escravos e terras dos inadimplentes de impostos. Consultar Evaldo Cabral de Mello, A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 39.    
 (9) O episódio em que Isabel de Moura Cavalcanti questiona o antigo e histórico engenho de sua avó, D. Isabel de Moura, é levantado e relatado por Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pgs. 90/ 91, tendo como fonte do próprio processo da morte do comerciante Roque Gomes Paes. O engenho “Boa Vista” havia sido deixado para trás aos holandeses pela avó, a respeitada D. Isabel de Moura. Este conflito teve um desfecho inesperado e trágico, pois seu marido, Leão Falcão de Mello, será comprometido. Ver mais detalhes no texto, parte “Desenvolvimento”.
     Informações sobre as inúmeras ligações de casamento do ramo principal dos Cavalcanti de Albuquerque com a família Falcão e Falcão Eça, igualmente lutadora na guerra holandesa, Bittencourt, Adalzira, opus cit., pg. 293. Informações completas sobre a família Falcão Eça e Falcão Marinho em Torres, Rosa Sampaio - artigo “O ramo Bezerra Cavalcanti na Guerra contra os Mascates”, nota biográfica de Leão Falcão d´Eça, aberto a consultas.  
(10) Inúmeros trabalhos da autora sobre a atuação política da muito antiga família Cavalcanti na península italiana, e da família Cavalcanti de Albuquerque, no Brasil, estão publicados no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br. Outros ainda inéditos, já disponíveis para pesquisa, citados já nas várias notas deste mesmo trabalho.  
(11) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 74, com todas as fontes indicadas e citadas nota 32.
(12) Comentários sobre o contexto do “Levante de Itamaracá”, adiante no texto e na nota 37.
(13) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87, referindo-se a uma carta de Jerônimo C. de A. Lacerda, já bisneto do florentino, ao rei português. Ver mais na nota 33 com fontes. 
(14) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, p.87, com todas as fontes indicadas.
(15) Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87, 310. 
     Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina - O Magnificat, Memórias Diacrônicas de Dona Isabel Cavalcanti, Tempo Brasileiro, RJ, Fundação Roberto Freire, 1990, pg. 128,129, obra em que a autora se refere a Jorge Cavalcanti de Albuquerque II como não querendo aceitar o perdão real em 1714. A autora utiliza fontes documentais básicas, ainda não identificadas por se tratar de um romance. 
      Consultar ainda as notas biográficas citadas em Torres, Rosa Sampaio - artigo “O ramo Bezerra Cavalcanti na Guerra contra os Mascates”, aberto a consultas.  
(16) O adjetivo “sdegnoso” por nós traduzido como altivo, sombranceiro, indignado, desdenhoso, não respeitoso, é usado pela história literária para descrever a conduta política da família Cavalcanti na península italiana. O cronista Dino Campagni (c.1255-1324) usara o adjetivo “sdegnoso” para descrever o poeta Guido Cavalcanti, seu contemporâneo, no séc. XIII. 
      O escritor Giovanni Boccacio no seu Decameron, 6º dia, nona novela, “A cena do cemitério”, trabalho escrito no século seguinte, repete o mesmo adjetivo “sdegnoso” ao descrever o poeta Guido Cavalcanti em sentido positivo, conto que não pode deixar de ser lido para melhor compreensão da personalidade e da obra do poeta Guido (descrição também repetida por Haroldo de Campos, Pedra e Luz na Poesia de Dante, Imago, 1998, pg. 14). 
      A partir, portanto, da tragédia ocorrida com o poeta Guido Cavalcanti, amigo de Dante, que no século XIII enfrentara o clã aristocrático e prepotente dos Donati, os Cavalcanti foram descritos por fontes literárias como “sdegnosos”, além do mais notórios nos seus enfrentamentos posteriores ainda contra a família dos Médici, no século XVI, pela manutenção dos ordenamentos da Republica florentina.  
    Cesare Trevisane, em seu romance La conjura di Pandolfo Pucci, Florenze, Tip. de Monnie, 1852, utiliza muitas vezes a expressão “sdegnoso” para os Cavalcanti como família. 
      A respeito da utilização do termo “sdegnoso”, consultar os vários trabalhos da autora com fontes citadas, especialmente a “Conspiração Pucci & Cavalcanti” e “Médici X Cavalcanti” no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com/, ainda “Mazombos’ e “Os Sdegnosos Cavalcanti”, no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br  
    Sobre preâmbulos da formação do ideário de independência consultar também o recente livro de Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina – Matias, Recife, Bagaço, 2012, livro em que esta autora reconhece o importante papel, ainda não consciente, também de Matias de Albuquerque para a formação da brasilidade durante o primeiro momento de resistência contra a invasão holandesa.  
(17) Assunto já abordado na nota acima 3, onde rebatemos as propostas explicitadas por Evaldo Cabral de Mello sobre ao segmento social da “nobreza da terra” em A Ferida de Narciso, Ed. SENAC, 2001. 
(18) Ver nota 8. Ainda conclusões apresentadas em Torres, Rosa Sampaio – artigo “Antonio Cavalcanti de Albuquerque, o da Guerra”, ainda inédito, mas já aberto a pesquisas, com muito mais informações históricas sobre as controvérsias políticas entre Antonio Cavalcanti e o reinol João Fernandes Vieira, bem como citados outros fatos históricos correlatos. 
   As dificuldades da “nobreza da terra” apresentadas modernamente nas obras de Antonio Gonçalves de Mello e do próprio Evaldo Cabral de Melo. Ver bibliografia já citada na nota 8 e a relativa a estes dois autores citados abaixo nota 19.     
(19) Conclusões de Torres, Rosa Sampaio para o artigo “Antonio Cavalcanti de Albuquerque, o da Guerra”,já aberto a consultas e  que se baseia nas informações genealógicas de Adalzira Bittencourt, opus cit. (onde a autora utiliza Jaboatão, Borges da Fonseca , corrigidos por  Carlos Xavier de Brito) e também o genealogista Carlos Eduardo Barata – Dicionário das Famílias Brasileiras – verbete Cavalcanti. Informações cotejadas especialmente com Fernandes Gama, José Bernardo – Memórias Históricas da Província de Pernambuco, Recife, 1844-1887 (utilizada a edição do Arquivo Publico Estadual, Recife, 1977), obra dos oitocentos. Neste artigo o surgimento do sentimento nativista é examinado a fundo, suas razões e personagens em causa exaustivamente analisados.  Utilizadas também, entre as obras recentes, especialmente:                                                      
              Gonçalves de Mello, José Antonio - Tempo dos Flamengos, 4ª ed. Topbooks, 2001, pg. 172,173. 
              Evaldo Cabral de Mello - Rubro Veio, Topbooks, 1997, capitulo “O panteão                                                               
                                                            restaurador” pgs. 80, 91,162, 200, 213, 412, 441.                                           
                                                      - O Brasil Holandês – Penguin e Cia. das Letras, 2010. 
                                                      - Olinda Restaurada, Topbooks, 2 ed., 1998, pg. 218,      
219. 
                                                  - Fronda dos Mazombos, citada, pg. 210-213.  
                                                  - A Ferida de Narciso, Ed. SENAC, S.P. 2001.
(20) O contexto da Restauração contra os holandeses é enfocado em Torres, Rosa Sampaio - artigo “Antonio Cavalcanti de Albuquerque, o da Guerra”, com fontes em parte citadas nota 19, acima. Ver bibliografia também na nota 19.
(21) Comunicação de João Fernandes Vieira e Antonio Cavalcanti ao Alto e Supremo Conselho, em 8/7/1645, documento referido por Cabral de Mello, Evaldo - Olinda Restaurada, citada, pg. 218, 219 como publicado em RIAP 35 (1888), pg.35, originalmente na BN. 
(22) Obra de Evaldo Cabral de Mello - Rubro Veio, Topbooks, 1997, capitulo “O panteão restaurador”, Antonio especialmente citado pgs. 80, 91,162, 200, 213, 412, 441.              
(23) Conclusões de Torres, Rosa Sampaio - artigo “Antonio Cavalcanti de Albuquerque, o da Guerra”, fontes básicas indicadas acima na nota 19.
     A memorável carta enviada “Aos Senhores Holandeses” por Henrique Dias, comandante das tropas negras – composta de escravos com promessas de libertação - comprova o que acima afirmamos e dão quase a completa dimensão dos fatos.   
    Citamos pequeno trecho nitidamente nativista em que Henrique Dias, convocado mais uma vez pela nobreza, pois já anteriormente havia servido ao donatário Matias Albuquerque Coelho no momento da invasão dos holandeses, e que agora voltava também decidido à luta: 
   “Ouvida sua razão [dos moradores da terra], e conhecendo quanta razão tinham de se levantarem, pusemo-nos a caminho e viemos ajudá-los [....] Meu camarada, o Camarão, não está aqui; mas eu respondo por ambos. Saibam Vossas Mercês que Pernambuco é Pátria dele e minha Pátria, e que já não podemos sofrer tanta ausência dela. Aqui haveremos de perdar as vidas, ou havemos de deitar a Vossas Mercês fora dela. E ainda que o Governador e Sua Majestade nos mandem retirar para a Bahia, primeiro que o façamos havemos de responder-lhes, e dar-lhes as razões que temos para não desistir desta guerra”. Carta transcrita da Coleção Historia Nova – 3, As invasões holandesas, Rio, 1964. Os grifos são nossos.
(24) Observamos, especialmente, que a morte de Jerônimo Barbalho Bezerra, membro da família Bezerra aliada na guerra holandesa e já casada na Cavalcanti de Albuquerque - filho do notável comandante na guerra holandesa Luíz Barbalho Bezerra - ocorrera já no Rio de Janeiro em 1661, sendo ele enforcado e depois decapitado por machado por participação da “Revolta da Cachaça” nesta cidade, certamente a pretexto de questionamentos referentes a impostos da cachaça e carne. 
    Não podemos concluir ainda que os dois fatos estejam ligados, mas acreditamos que possam devem ter tido já influencias nativistas mútuas. 
    Em Pernambuco os conjurados, confabulando contra Mendonça Furtado, reuniam-se em casa do senhor de engenho João de Novalhaes (ou Navalhas) y Urréa, dentre os quais o juiz de Olinda, André de Barros Rego, os vereadores Lourenço Cavalcanti e João Ribeiro, estimulados nesta ocasião pelo próprio João Fernandes Vieira, então já grande devedor da Coroa. 
   Mendonça Furtado, num ardil dos conspiradores, foi levado a encontrar-se com uma procissão que levava os sacramentos da eucaristia, o viático, também chamado “Nosso Pai”, a ser ministrado aos moribundos e pelo costume obrigado a acompanhá-la de volta até o interior da Igreja. Aí foi intimado a entregar-se frente aos conspiradores armados, em 31 de agosto de 1666. (informações de Bittencout, A.- opus cit., pg. 296 e Souto Maior, A – História do Brasil, 6ed, 1968, pg.181-200, confrontadas com Cabral de Mello, Evaldo - Fronda dos Mazombos, citada, pg.19, capítulo “O agosto do Xumbregas”). Trata-se, portanto, de Lourenço Cavalcanti de Albuquerque casado com Mariana Uchoa e não Lourenço Cavalcanti Uchoa, conforme nos indica Cabral de Mello, porque este seu filho irá agir somente na geração posterior.  
   Cabral de Mello, Evaldo - Fronda dos Mazombos, citada, pg. 20, afirma sobre atividades de Jerônimo de Mendonça Furtado, depois alegadas também frequentemente contra demais funcionários da Coroa: “Afrontado a honra dos vassalos, ele administrava como um tirano, interfiria no funcionamento do judiciário, executava dívidas, seqüestrava bens, em especial das fábricas dos engenhos e nos partidos de cana, prendia e soltava ao seu talante, tudo em troca de dinheiro...”.
     Mendonça Furtado era apelidado de Xumbrega - referência ao general alemão Von Schomberg, mercenário que lutara na  Restauração, de bigode semelhante ao dele. 
      O pretexto do movimento, que culminou com a prisão e deposição Mendonça Furtado teria sido a entrada no porto do Recife de uma esquadra francesa. Os rebeldes fizeram correr a noticia que o governador estaria a serviço dos estrangeiros e que preparavam um ataque à província, seu conseqüente saque. Sobre o pretexto da prática religiosa “do Nosso Pai” o governador foi maliciosamente conduzido para a igreja. Ao sair, André de Barros Rego deu-lhe voz de prisão, sendo ele sido levado como prisioneiro à fortaleza de Brum. Os franceses desembarcados foram perseguidos – uns conseguindo refugiar-se num convento, outros presos. 
    Mendonça Furtado foi substituido por André Vidal de Negreiros, que já havia liderado contra os holandeses e exercido o cargo de governador por um período, capaz assim de apaziguar temporariamente os ânimos em Pernambuco. 
(25) A jovem Isabel Cavalcanti era descendente do filho Antonio do florentino por seu pai Felipe Cavalcanti de Albuquerque, sendo, portanto sobrinha de Jorge Cavalcanti (Bittencourt, A.- opus cit., pg. 292). Seu pai lutara na guerra holandesa, certamente acompanhando a retirada épica para a Bahia, tendo aí se casado com Maria de Moura e voltado à Pernambuco com filhos ainda pequenos, falecendo em Ipojuca no ano de 1657. Felipe é o tronco dos Cavalcanti de Albuquerque de Gusmão do engenho Castanha Grande. Sua figura é aprofundada no artigo “O ramo do Castanha Grande”, próximo no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br . Ver mais algumas informações nota abaixo 30.
(26) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 90, 91, usando como fonte o próprio processo de esclarecimento da morte do mascate Roque Gomes Paes.
(27) Pesquisa apresentada em Torres, Rosa Sampaio – artigo “O Ramo do Castanha Grande”, próximo no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br.
(28) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 90, 91 tendo como fonte o processo do mascate Roque Gomes Paes.
(29) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 90, 91, tendo como fonte o próprio processo da morte mascate Roque Gomes Paes.      
(30) O abandono do engenho "Boa Vista" aos holandeses trará importantes consequências na vida de gerações futuras de Cavalcanti de Albuquerque, não só para esta nossa Isabel Cavalcanti, filha de Maria Lacerda e de Felipe C. de A., casada na aguerrida família Falcão. Os protestos de Isabel Cavalcanti pela manutenção de seu engenho acabam determinando não só a morte de seu marido na prisão, mas, a que tudo indica, irão se constituir uma das razões de conflitos da nobreza da terra com a Metrópole, justificadoras mesmo da Guerra dos Mascates. Pois nota-se que Felipe C. de A., genro de Isabel de Moura e pai de Isabel, teve ainda várias outras de suas filhas casadas na família Falcão e Falcão Eça, cujos membros, a partir desta disputa do engenho “Boa Vista”, estarão igualmente em conflito aberto com a coroa. Os Falcão e Falcão Eça com os Cavalcanti de Albuquerque participarão como lideranças da “Guerra contra os Mascates”, quando o jovem Leão Falcão d´Eça acaba mesmo morrendo nas Índias degredado e o ramo dos Bezerra Cavalcanti martirizado.
     Sobre este drama familiar continuado, consultar Torres, Rosa Sampaio – artigo “O Ramo Bezerra Cavalcanti e a Guerra contra os Mascates”, inédito, com conclusões pessoais e todas as fontes indicadas. Fonte básica Evaldo Cabral de Mello, A Fronda dos Mazombos, em especial o capítulo 2 confrontado com fontes genealógicas dos Cavalcanti de Albuquerque. Notícias sobre os Marinho Falcão e Falcão Eça, aliados de Antonio Cavalcanti na guerra holandesa, artigo em preparação “Antonio da Guerra Holandesa”.
(31) Sobre o conceito de “sdegnoso”, ver nota 12.
(32) Assim sendo, teriam Jorge de Albuquerque e a Câmara de Olinda conseguido, certa vez, impedir a entrada de um magistrado régio. Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg.73, episódio sem data precisa, mas cujas fontes estão na Biblioteca Nacional de Lisboa, “Pombalina" 29, fls. 289-90, 292, 369-73.
(33) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 65, com fontes. 
       Ver também a ‘Conspiração do Nosso Pai” comentada no texto acima, conspiração de que tanto seu pai, Lourenço C. de A., como o pai de João, André de Barros Rego, haviam participado. 
    O episódio da contestação nativista do jovem Cavalcanti Uchoa contra taxações de vinho e carne, ocorre trinta anos depois da morte de Jerônimo Barbalho Bezerra, filho de importante militar aliado da família, enforcado por contestação a impostos de cachaça e carne no Rio de Janeiro em 1661. Ver nota 24. 
   Depois deste episódio em que o jovem Lourenço Cavalcanti Uchoa quase foi deportado pelo governador Montebelo em 1691, ele já por volta de 1710 estará em sua própria casa novamente conspirando com Manuel Carneiro da Cunha e outros, agora contra o governador Castro Caldas, ocasião dos preparativos do grande levante da “nobreza da terra” contra os mascates e autoridades portuguesas que darão início a chamada “Guerra contra os Mascates” (Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 253. O autor, entretanto, não relaciona os dois primeiros fatos, pois não consegue identificar a linha genealogica).    
                        Com a severa repressão real, ao fim da guerra (1714), Lourenço Cavalcanti Uchoa estará ainda escondido nos matos pernambucanos com outros nobres como Cristovão de Holanda Cavalcanti, Pedro Ribeiro da Silva, Duarte de Albuquerque da Silva e Martinho de Bulhões, ainda mais cerca de quatrocentos rebeldes, de lá só saindo com o perdão real (Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pág. 516). 
(34) Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 81.
(35) Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg 74, com todas as fontes indicadas. Ainda Torres, Rosa Sampaio “O ramo Bezerra Cavalcanti na Guerra contra os Mascates”, aberto a consultas com notas biográficas de Jorge de Albuquerque I. Também nosso trabalho “O Mazombo” próximo no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br   
(36) A filha de Antonio “da Guerra”, Leonarda, havia se casado na família dos fidalgos e heróis Bezerra Felpa Barbuda, com Cosme Bezerra Monteiro. Bittencourt, Adalzira - Genealogia dos Albuquerques e Cavalcantis, Rio de Janeiro, Livros de Portugal S/A, 1965, pg. 297.
                        Sobre a família Barbalho Bezerra e Bezerra Monteiro, estamos terminando trabalhos sobre suas participações na Guerra contra a invasão Holandesa (Artigo “Antonio Cavalcanti de Albuquerque, o da Guerra Hondesa”) e também na Guerra da Restauração (artigo “O ramo Bezerra Cavalcanti e a Guerra contra os Mascates”), ambos em finalização e já referidos. 
                        Relato do episódio transcrito de Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada pg.77 que, na nota 68, cita como sua fonte relato do juiz Diogo Rangel em BNL, Pombalina 239, fls, 382-3. 
(37) Os rebelados de Goiana, em 1º de agosto de 1692, tentavam impedir o cumprimento da ordem régia e a entrega da capitania de Itamaracá ao representante do marques de Caiscais. Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 77, resume a situação da nobreza da terra na capitania: “Segundo o seu manifesto, redigido por um carmelita de Goiana, frei João de São José, a opção era clara. Ou vassalos do monarca ou escravos do marquês [de Caiscais]. O retorno ao domínio do donatário não só as desvantagens de natureza fiscal como o também estamental, pois o soberano, já não tendo serviços a recompensar, não premiaria os pró-homens com foros de fidalgos e hábitos de ordens militares”.
(38) Jerônimo C. A. de Lacerda, filho de Felipe C. de A. tinha a responsabilidade de Capitão-Mor de Itamaracá e teria sido detido neste levante popular promovido “por este seu próprio tio Jorge”, e assim se queixado “deste tio” à El Rei (a genealogia de Jorge Cavalcanti é cruzada por nós com a de Jerônimo C. de A. Lacerda, conforme Bittencourt, Adalzira - Genealogia dos Albuquerques e Cavalcantis, Rio de Janeiro, Livros de Portugal S/A, 1965, pág. 292, 293 - Cabral de Mello, E. - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87, nota 93, refere como fonte carta de Jerônimo C. A. de Lacerda ao rei D. Pedro II, carta datada de 23/ 07/ 1694).
    Pela difícil situação criada, esta foi nossa interpretação dos fatos ocorridos.   
    Notamos que este levante popular que Jorge liderou e articulou é episódio importante, pois se constitui o antecedente historiográfico mais próximo a uma “fronda” da nobreza da terra em 1710, como a classificaria o prórpio historiador Evaldo Cabral de Mello.  
(39) A que tudo indica parte de sua parentela, mais tímida políticamente, já temia o aparente destempero de Jorge.
     Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 86,87, cita as insatisfações contra Jorge Cavalcanti expressas pelo prior do Carmo, pelo pároco de Goiana, por seu próprio sobrinho Jerônimo C. de A. Lacerda e também por Francisco de Barros Falcão, irmão de Leão Falcão de Mello - o marido de Isabel Cavalcanti que já havia mesmo morrido na prisão. 
    Notamos que posteriormente, entretanto, tanto o filho de Jerônimo, Manuel C. de A. Lacerda, quanto o próprio Francisco de Barros Falcão irão apoiar os Bezerra Cavalcanti revoltosos no levante amplo da nobreza de 1710, tomando posições francamente decididas por este movimento. Ver  Torres, Rosa Sampaio, artigo “O ramo Bezerra Cavalcanti na Guerra contra os Mascates”, aberto a consultas.  Cabral de Mello, Evaldo- A Fronda dos Mazombos, citada, índice onomástico. 
(40) Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87. 
(41) A morte Jorge de Albuquerque e suas possíveis causas é referida em Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87. A data da sua morte baseadas nestas cartas enviadas a D. Pedro II no ano de 1695, em AHU, PA, Pco, cx 11.  
    Ver ainda Torres, Rosa Sampaio - artigo “O Ramo dos Bezerra Cavalcanti na Guerra dos Mascates” com nota biográfica sobre Jorge Cavalcanti de Albuquerque I. Também nosso trabalho “O Mazombo” no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br
(42) Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, opus cit. 
        Especialmente neste enfoque Torres, Rosa Sampaio - artigo “O Ramo dos Bezerra Cavalcanti na Guerra dos Mascates”, onde as relações familiares e seu entroncamento são criteriosamente pesquisados e apresentados.
(43) Informações de Cabral de Mello, Evaldo - A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87 e pg. 310, complementadas por informações trazidas por Maria Cristina “O Magnificat, Memórias Diacrônicas de Dona Isabel Cavalcanti”, Tempo Brasileiro, RJ, Fundação Roberto Freire, 1990, pg. 128,129. Nesta obra a autora se refere a Jorge Cavalcanti de Albuquerque II como não querendo aceitar por fim o perdão real, um sinal de sua detenção nas cinco Pontas com os demais rebeldes da nobreza, a maioria deles na última hora perdoados.  A autora afirma utilizar fontes documentais, se bem não citadas por se tratar de um romance. 
      Consultar ainda Torres, Rosa Sampaio - artigo “O Ramo dos Bezerra Cavalcanti na Guerra dos Mascates” com nota bibliográfica mais detalhada sobre Jorge Cavalcanti de Albuquerque II.  
(44) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 87, citando sua fontes. 
(45) Cabral de Mello, Evaldo – A Fronda dos Mazombos, citada, pg. 363.
(46) Cabral de Mello cita o tipo de agressão dos portugueses com cacetes.  Os japoneses, sabemos, tinham como uma grande afronta o corte do rabicho de seus cabelos.  
(47) Ver este episódio de humilhação sobre os nobres na historia italiana relatado por Simoncelli, Paolo – Fuoriuscitismo Republicano Florentino, FrancoAngeli, Milano, 2006.  O mesmo tipo de castigo humilhante infringido no idoso João Rego Barros na descrição de Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina – O Magnificat, pg 129.    
(48) Ainda sobre Jorge Albuquerque ver ainda comentários Torres, Rosa Sampaio – artigo “Mazombo”, em seu blog na mídia eletrônica. 
(49) Sobre os Cavalcanti e os ideais republicanos manifestados pela primeira vez na Guerra dos Mascates, consultar especialmente Torres, Rosa Sampaio - “Os Cavalcanti e os ideais republicanos no Brasil Colonia”, já publicado no blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com/
(50) Notamos que a Isabel Cavalcanti referida neste parágrafo é a neta do florentino, a matriarca dos Bezerra Cavalcanti e não a filha de Felipe, Isabel de Moura Cavalcanti. 
   O tema da guerra dos Mascates pensamos ter esgotado em Torres, Rosa Sampaio – “O ramo Bezerra Cavalcanti na Guerra contra os Mascates”, já aberto a consultas.  
  





Bibliografia específica. 




Bittencourt, Adalzira - Genealogia dos Albuquerques e Cavalcantis, Rio de Janeiro, 
Livros de Portugal S/A, 1965.

Barata- Carlos Almeida & Bueno, Antonio Henrique Cunha - Dicionário das Famílias. 
  Brasileiras, Ibero-América, 1999.

Cabral de Mello, Evaldo – O Nome e o Sangue – Cia. da Letras, 1989.

          – A Fronda dos Mazombos, Cia. das Letras, 1995. 

    - Rubro Veio, Topbooks, 1997. 

    - Negócios do Açúcar – 3ª ed. Topbooks, 2003. 

    - O Brasil Holandês – Penguin e Cia. das Letras, 2010.

                        - A Ferida de Narciso, Senac, SP, 2001.

Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina - O Magnificat, Memórias Diacrônicas de. 
Dona Isabel Cavalcanti, Tempo Brasileiro, RJ, Fundação Roberto     
Freire, 1990.

Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina – Matias, Recife, Edições Bagaço, 2012.

Fernandes Gama, José Bernardo – Memórias Históricas da Província de Pernambuco,    
                                  Recife, 1844-1887, utilizada a edição do Arquivo Publico, 
                                  Estadual, Recife, 1977.                                                     


Gonçalves de Mello, J. A. – artigo “As Consequências fiscais do chamado donativo 
para o casamento da rainha da Grã-Bretanha e da Paz da Holanda”, in   RIAP 54 (1981).

Gonçalves de Mello, José Antonio - Tempo dos Flamengos, 4ª ed. Topbooks, 2001. 

Gonçalves de Mello, José Antonio – João Fernandes Vieira – biografia, Universidade 
de Recife – 1956.

Simoncelli, Paolo – Fuoriuscitismo Republicano Florentino, FrancoAngeli, Milano, 
2006.  

Torres, Rosa Sampaio - livreto “Família Cavalcanti de Albuquerque”, livreto, 1ª edição    
                                em 2001, ainda restrita à família. Em revisão para 2ª edição. 

Torres, Rosa Sampaio – todos os inúmeros artigos editados no blog                  
                   http://rosasampaiotorres.blogspot.com/,  especialmente: 
  - “Conspiração Pucci & Cavalcanti”,
                           - “Médici X Cavalcanti” 
                                      - “Giovanni di Lorenzo Cavalcanti e seus Filhos...”,   
              - “Filippo di Giovanni Cavalcanti no Brasil”,     
               - “Os Sdegnosos Cavalcanti” 
               - “Mazombos” (2013).
  
   - artigo “O Ramo do Castanha Grande”, próximo no blog 
            http://rosasampaiotorres.blogspot.com.br
     - “Antonio Cavalcanti de Albuquerque”, aberto a consultas,          
       próximo livro no prelo. 
   - “O Ramo Bezerra Cavalcanti e a Guerra contra os 


         Mascates”, em fim de elaboração.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A família Cavalcanti e os ideais republicanos no Brasil Colônia


          O nosso respeitado historiador Evaldo Cabral de Mello em seu artigo “O Mito de Veneza” afirma:
                           
                 “Ao tempo da guerra dos Mascates (1710-11) o estabelecimento de uma república, o modelo que se tinha em vista era o veneziano... Parece plausível que o Mito de Veneza tenha apontado entre nós graças aos colonos florentinos fixados em Pernambuco desde meados do Séc. XVI”. 
         
       E acrescenta: 
                     “... oligárquicos os Cavalcanti, como seus parentes Manelli e Acioly (portuguesismo para Acciaiuolli) cujos rebentos também se domiciliaram em Pernambuco, tinham uma longa crônica de ativismo político, como sabe o leitor da História Florentina de Maquiavel” (1).
           
       Seguindo a linha de pensamento Cabral de Mello neste artigo, poderíamos inferir que o jovem Stolto Cavalcanti, degolado em Florença no ano 1559, e até mesmo Filippo di Giovanni Cavalcanti pouco depois fugido para Pernambuco, tivessem conspirado contra a família Medici defendendo uma República “ottimati”, à maneira veneziana de governo (2). 

           Recentemente, instada a prestar algumas informações sobre a família Cavalcanti ao jornalista Rodrigo Cavalcanti da revista “Historia” (editora Abril), questionei pela primeira vez estas proposições do nosso respeitado historiador - sobre as possíveis influências do modelo veneziano no comportamento político de Filippo Cavalcanti e seus descendentes no Brasil. Já havia tecido alguns comentários críticos a estas proposições, comentários apenas colocados em notas de rodapé de meus artigos. 
         Mas, ao discorrer sobre o assunto para um jornalista, pensei podia incorrer em indelicadeza com Cabral de Mello ou mesmo aparentar palpites descabidos. 
         Por este motivo me proponho agora, em breve artigo específico, aprofundar o tema do republicanismo no período Colonial, assunto sem dúvidas ainda relevante para os Cavalcanti atuais.

        Lembro que ao analisar, em um ensaio, a vida do famoso conspirador florentino pela República Bartolomeo di Mainardo Cavalcanti, parente atuante pela Republica na península italiana do século XVI, tive as primeiras dúvidas sobre as afirmações de Cabral de Mello e o possível entusiasmo “ottimati” de nossos ancestrais. 
       Percebera que o historiador italiano contemporâneo, Paolo Simocelli, chamava a atenção do leitor para o surgimento, já naqueles meados do séc. XVI na Toscana, de um republicanismo profundo e levado às ultimas consequências, colocando focos muito potentes sobre a dedicada atuação de nosso Bartolomeo (3).    
    Bartolomeo, já famoso como ativista, fora escolhido pelos franceses para o governo de Siena, cidade vizinha de Florença já em fase de Republica plena, mas que a partir de 1554 sofria o dramático assédio militar das forças unidas do Santo Império e de Cosme de Medici - episódio da guerra entre França e Espanha. Lidando com forças republicanas de várias tendências que unidas lutavam desesperadamente pela defesa da Republica de Siena, Bartolomeo não poderia ser percebido como um mero seguidor de regimentos políticos venezianos. 
      Sabemos que o jovem Bartolomeo dialogara com Maquiavel em 1526 (4) e havia atuado de modo conseqüente no período da segunda República florentina de 1527/30, sem, entretanto, chegar a ser um radical.  Seu pai, Mainardo Cavalcanti, neste episódio, fora um seguidor dos ideais republicanos decididos do líder florentino Nicolau Capponi (5). Após a capitulação de Florença em 1530, Bartolomeo continuou enfrentando os Medici, tentando conciliar as várias frentes republicanas - religiosas, liberais ou radicais – para a defesa da Republica de Florença corrompida e descaracterizada pelos Médici, e depois na trágica defesa da Republica de Siena. Por fim, com a colaboração da própria corte francesa, liderou em 1559 a audaciosa conspiração que deveria eclodir de forma simbólica numa celebração religiosa contra Cosme de Medici, já por muitos tido como um tirano em Florença (6). 
    
      Acreditamos que também o nosso patriarca Filippo di Giovanni Cavalcanti - cujo pai e irmãos desenvolveram atividades de comerciantes de arte, “doublés” de diplomatas - nobre ilustrado e politicamente experiente, não seria um ingênuo “ottimati” ao chegar à Pernambuco.   Seu pai atuara na defesa de Florença na Segunda Republica (1527-1530) e ele próprio conspirou muito provavelmente, como concordamos eu e Evaldo, com seu parente Bartolomeo em 1559 (7). Talvez Stolto Cavalcanti do ramo “Ciampoli”, jovem filho de banqueiro por fim degolado com o fracasso da “Conspiração Pucci e Cavalcanti”, fosse algo impetuoso e politicamente menos experiente (8). 
     
    Ainda que as discussões sobre regras republicanas tivessem feito sucesso entre os intelectuais florentinos da década de 1520 nos jardins da família Rucellai [Orto Oricellai], indago se depois das experiências religiosas do período de Savanarola em Florença no fim do século anterior, e da experiência do cerco da Segunda Republica de Florença que beirou o radicalismo entre 1527/30, ainda dos embates continuados contra os Medici do fim década de 50, essas “colorações” republicanas tivessem algum sentido na Toscana quase no fim do século – e nossos parentes Stolto e Felippo pudessem vir a ser percebidos desta maneira, desejosos de uma republica de “otimattis”. 
     A luta anti-medici fora o objetivo maior e comum dos exilados florentinos republicanos (os “fuoriusciti”) pelo menos desde a década de 1520. Neste sentido, haviam eles persistentemente buscado agregar inúmeras facções políticas, das mais liberais às mais populares e radicais, ou mesmo teológicas, como nos demonstra o citado historiador italiano Simoncelli.  

   Observamos, especialmente, que depois da derrota de Siena na batalha de Marciano, agosto de 1554, centenas de famílias sienenses resistentes haviam se juntado às forças militares do filho de um banqueiro - o comandante ferido Piero Strozzi, que curava seus ferimentos na fortaleza de Montalcino (9). E, por quatro anos estas famílias, abrigadas pela celebre fortaleza, aí haviam vivido e resistido pela liberdade, ordenando-se nas regras já plenamente republicanas e populares de seu próprio sistema político. Mas em 1559 teve fim esta experiência denominada “República Popular de Siena Retirada para Montalcino”, episódio que hoje sabemos historicamente muito significativo, marco importante do republicanismo moderno (10).  
     Com a paz de Cateau Cambrèsis, entre França e Espanha, a região foi cedida financeiramente pelos espanhóis a Cosimo I. 
     Este, acabando por destruir a já tão descaracterizada Republica Florentina, estruturou por fim o seu tão desejado “Grão-Ducado da Toscana” (11). 
     
    A queda da “Republica Popular de Siena Retirada para Montalcino” ocorre, portanto, no mesmo momento da descoberta da “Conspiracão Pucci & Cavalcanti” liderada por Bartolomeo Cavalcanti e preparada para eclodir em Florença no mesmo mês de outubro do ano de 1559 –episódios que constituem, a nosso ver, momentos culminantes da resistência do sistema republicano na península italiana, frente aos Médici dominantes na Toscana – ambos ocorridos no mesmo momento histórico, marco do republicanismo. 
    A partir desses episódios florentinos e toscanos da década de 1550, o historiador Simoncelli sugere mesmo o aparecimento de uma idéia nova e ampla de República na Europa, ideia que posteriormente teria continuidade na França e nos Estados Unidos no séc. XVIII.   As próprias raízes do pensamento iluminista de Montaigne podendo ser encontradas no episódio da defesa de Siena - defesa da qual seu próprio pai como militar, participou.
 (12) (13) (14).
     
    Certamente o nosso patriarca Filippo Cavalcanti, enquanto jovem na Europa, também vivenciou esta tragédia de sua familia ampla através a experiência política e diplomática característica do seu ramo “Cavalleschi”, tendo tido a oportunidade de confrontar e de conviver com as inúmeras tendências republicanas que se somavam para tentar derrubar os Medici. 
    Experientes, Bartolomeo e Filippo teriam conseguido debandar antes da descoberta da “Conspiração Pucci & Cavalcanti” em 1559, quando foi pretendida a explosão do trono de Cosimo I, em Florença. Stolto não conseguira fazer o mesmo.  
    O nosso nobre Fillippo teria aportado aqui, portanto, já bem consciente e politicamente experimentado.    
     Poucos anos depois, outros jovens rebeldes de famílias florentinas, igualmente republicanas e consequentes - Machiavelli, Capponi, Soderini - estarão também em franca debandada da península italiana, caçados e mortos por mercenários dos Medici por toda a Europa, após igual fracasso da “Conspiração Pucci & Ridolfi” de 1575 (15). 
     
    Consequentemente, seria ingenuidade nossa referendar tendências “ottimatti” trazidas ou estimuladas por Filippo Cavalcanti e seus parentes Manelli e Acciaolis no Brasil. Idéias para ele mesmo e seus parentes florentinos, durante muito tempo e por variadas razões, perigosas para serem explicitadas no Brasil dos séculos XVI e XVII (16). Idéias políticas, sobretudo, deslocadas em uma Colônia do Império português que, não só os abrigava, mas que os convocava pouco depois, com seus parentes colaterais donos da capitania, puro Albuquerque ou Albuquerque Maranhão, para a defesa contra as invasões holandesas - obrigações familiares a que os Cavalcanti de Albuquerque não se furtaram (17).  
      
    O perigo de explicitar ideais republicanos numa colônia portuguesa não impediu, entretanto, que já bem mais tarde, no começo do século XVIII, um fidalgo pernambucano desatinado ou ambicioso, Bernardo Vieira de Mello, sugerisse perante uma Câmara pernambucana reunida, durante a fronda da “nobreza da terra” de 1710: melhor se declarassem em Republica, “ad instar dos venezianos”, ou que se entregassem aos polidos franceses do que continuar a servir aos grosseiros e ingratos mascates portugueses. Por estas possíveis impropriedades verbais Vieira de Mello será duramente punido pela Coroa, morrendo na prisão em Lisboa (18).
     
     Se por aqui os Cavalcanti de Albuquerque foram súditos da Metrópole portuguesa, proprietários de terras e escravos - situação que gerou conflitos e contradições observáveis na descendência de Filipp, pelo espírito “sdegnoso” e libertário mantido pela família (19) – neles ressalta, entretanto, uma identificação republicana atávica e profunda. Haviam se mantido conscientes da experiência política longeva que moldara os Cavalcanti na Idade Media em Florença, em especial cultores de uma figura notável em sua época, o político e poeta Guido Cavalcanti do século XIII. Este longo passado familiar de atuação em Republica certamente inclinou os Cavalcanti, no Brasil, também para a vida política participativa, tornando-os permeáveis e receptivos aos ideais da ruptura colonial, ainda inclinados para a reestruturação política republicana, já em sentido amplo e moderno.  
   Se não fez proselitismo político, o florentino Filippo deve ter instruído politicamente muito bem seu filho mais velho, Antonio.  Este, pelos filhos Isabel e Filipe, desenvolve ramos descendentes que, no decorrer de vários séculos, demonstram uma conscientização política eminentemente crítica, superior para o Brasil da época, conforme constatamos em nossos vários trabalhos. 
   
    Aqui os sensíveis e ainda “sdegnosos” Cavalcanti de Albuquerque tornaram-se os precursores de movimentos contestadores e libertários, a exemplo do comportamento nativista de Antonio Cavalcanti, o “da Guerra”, representante de “nobreza da terra” em precoce confronto por liderança militar com o reinol João Fernandes Vieira, no início das lutas da Restauração (1645). 
     Se, no século seguinte, na “Guerra dos Mascates” (1710) (20), os Cavalcanti de Albuquerque estiveram aparentemente limitados a questionar o predomínio mascatal, o sacrifício do ramo mais contestador da família, o ramo dos Bezerra Cavalcanti, comprova não só a sinceridade de seus ideais independentistas, mas demonstraria ainda a simpatia precoce deste ramo por ideais republicanos igualitários provenientes do iluminismo francês, como nos sugere o próprio Evaldo Cabral de Mello. 
     Em seu clássico “A Fronda dos Mazombos”, no capítulo VI, Evaldo sugere uma aliança dos Bezerra Cavalcanti com elementos como André Dias de Figueiredo e José Tavares de Holanda - este formado em Direito, falando um idioma estrangeiro, tendo possivelmente estudado na Europa – com influências de ideias europeias modernas e republicanas (iluministas?) já durante o episódio da Guerra dos Mascates (21).      
      
      No fim do século XVIII, portanto, pensamos estar amadurecendo por aqui não só as antigas experiências republicanas da península italiana, mas também já percebidas com muito bons olhos pelos ramos conscientes e muito bem informados dos Cavalcanti de Albuquerque as novas e bem sucedidas experiências americanas ampliadas, advindas do iluminismo.
     Estas novas convicções igualitárias, importadas da França e da América do Norte serão, finalmente, explicitadas pelos movimentos libertários defendidos pelo ramo dos Cavalcanti de Albuquerque do engenho “Suassuna” em 1801, na conspiração que leva este nome, com ideais independentistas e iluministas já bem definidos (22).
    Não podemos esquecer que ramos nativistas de Cavalcanti de Albuquerque, com seus parentes colaterais Albuquerque Maranhão, serão os segmentos com mais severidade punidos pelas autoridades portuguesas depois do fracasso da revolução Pernambucana de 1817, inúmeros membros da família Albuquerque Maranhão presos e martirizados (23). Cavalcanti de Albuquerque participantes nos antecedentes no processo da Independência (24) estiveram também presentes e ainda atuantes na própria “Confederação Republicana do Equador” (1824) (25).       
     
    Sugerimos, por nossas pesquisas recentes sobre o ramo principal e varonil dos Cavalcanti de Albuquerque estabelecidos no engenho “Castanha Grande” em Alagoas, que os caminhos da Abolição e da própria Proclamação da Republica tenham sido facilitados ainda pela convicção republicana longeva, sincera e profunda predominante nesta família - família no Brasil já numerosa e ainda bem influente nos fins do século XIX (26). 







Notas.

(1) Mello, Evaldo Cabral de - artigo “O mito de Veneza no Brasil”, publicado no jornal “Folha de São Paulo” em 1 de julho de 2001, artigo posteriormente incluído em seu livro Um imenso Portugal, Ed. 34, 2002, capítulo “O Mito de Veneza”, pg.158. Neste artigo o autor explicita maneira veneziana de governo, o modelo republicano “ottimati”: “Os “ottimati”, cujos doutrinários reuniam-se nas tertúlias do Orti Oricellari, buscavam desesperadamente desde o século XV estabelecer sua hegemonia mediante uma via média entre a monarquia dissimulada dos Medici e as republicas demasiadamente democráticas que para seu desgosto haviam sucedido efemeramente a queda da celebre dinastia tanto em1594 quanto em 1527”.    
     Sabemos que originalmente os “ottimati” na Roma antiga (em latim – “optimates”, os melhores) foram também conhecidos como Boni, "homens bons" e eram a maioria tradicionalista da antiga República Romana.  Tinham como objetivo limitar o poder das assembléias populares e dos tribunos da plebe, ainda estender o poder do Senado, que foi visto como mais dedicado aos interesses dos aristocratas. A causa dos “ottimatis” na Roma antiga chegou ao ápice na ditadura de Lucio Cornelio Silla (81-79ac), quando a Assembléia foi mesmo privada de seus poderes. 
(2) No livro citado nota acima, pg. 159, Cabral de Mello nos leva a presumir ainda que nossos parentes Stolto Cavalcanti, punido na “Conspiração Pucci e Cavalcanti” de 1559 e mesmo Filippo di Giovanni Cavalcanti, que aqui aportou em 1660, teriam defendido uma república de “ottimati”, à maneira veneziana de governo. 
   Cabral de Mello tenta transpor um equivoco de Sergio Buarque de Holanda, equivoco já explicitado em vários outros artigos de nossa autoria, ao afirmar: “Felipe abandonara Florença, primeiro por Portugal, depois, pelo Brasil, devido a seu envolvimento na conjura de Pandolfo Pucci contra os Medici, versão que permanecerá na tradição de seus descendentes. Como indicou Sergio Buarque de Holanda, o complô em apreço é posterior à chegada de Felipe a Pernambuco. O que não impede que ele se tenha metido em conspiração anterior, pois estas não faltavam no ambiente trepidante de Florença renascentista com sua viva tradição republicana de oposição aos Medici”.
   Sergio Buarque de Holanda cometera um equivoco em seu artigo “Os projetos de colonização e comércio Toscanos no Brasil ao tempo do grão Duque Fernando I (1587-1609)” - Revista de História n. 71, 1967, pg.103, pdf, pois a conspiração de que os Cavalcanti participaram realmente é a de 1559 e Filippo teria chegado em 1560.  Em verdade em 1575 ocorre uma outra conspiração, a “Conspiração Pucci e Rodolfi”.
    Sobre a atuação dos Cavalcanti em Florença e na Toscana contra os Medici, ver discussão texto abaixo e especialmente nota 8.
(3) Para acompanhar profundamente a discussão republicana na Toscana, no período dos Medici, séc.XVI, consultar especialmente o trabalho histórico recente e relevante de Paolo Simoncelli (Fuoriuscitismo Republicano 1530-54, FrancoAngeli, 2006) onde a atuação republicana de Bartolomeu Cavalcanti é, como a de outros, detidamente analisada. Um segundo livro sobre o tema é prometido pelo autor. Ainda sobre o assunto ver Torres, Rosa Sampaio – artigo “Notas Biográficas sobre Bartolomeo Cavalcanti” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ , com fontes e notas explicativas. 
(4) Consultar Torres, Rosa Sampaio – artigo “Notas Biográficas sobre Bartolomeo Cavalcanti” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/
   Maquiavel teria se correspondido uma ou duas vezes com Bartolomeo Cavalcanti, uma delas comprovadamente em 1 de novembro de 1526, carta citada em inúmeras fontes. Consultar especialmente as cartas relacionadas de Maquiavel. Também Lettere di Bartolomeu Cavalcanti –, prefácio Amadio Ronchini, pág. XLII e Bulletin Italien vol.1 e 2, Ferets e Fils, Université de Bordeau, 1901. 
   Lembramos que Nicolau Maquiavel, o escritor, desejou a proteção política compreensiva e “popolana” de Leão X, Giovanni Medici, naquela ocasião ainda protetor de nosso patriarca Giovanni di Lorenzo Cavalcanti, pai de Filippo.
     Maquiavel, como republicano, havia atuado preparando forças militares para a resistência de Florença no período final da República que havia afastado os Medici, entre 1498 e 1512, com participação política importante, sendo posteriormente anistiado. Entretanto, em 1513 foi novamente preso e torturado, talvez injustamente, incriminado em nova conspiração contra os Medici que haviam retornado ao poder. Por envolvimento neste episódio conspirativo, Maquiavel tentou o apoio do papa Medici Leão X - notado que o nosso Giovanni di Lorenzo Cavalcanti, então acompanhante e protegido por deste papa, nesta ocasião atuou negativamente às preensões de Maquiavel, fato referido em Sicca, Cinzia M. – Artigo “Consumption and trade of art beetween Italy and England in the half of the sixteenth century: the Londos house of the Bardi and Cavalcanti company” in Renaissance Studies 16, no2, 2002, pg. 169. 
     Sobre estas pretensões de Machiavel ser protegido por Leão X, consultar também carta de Nicolo Machiavelli a Francisco Vettori, 13 de março de 1513, carta comentada in Pires, Francisco Murari “Maquiavel e Tucídides”, ed. Eletrônica, on line. Sobre este episódio Torres, Rosa Sampaio – artigos “Giovanni di Lorenzo Cavalcanti e seus filhos” e “Giovanni di Lorenzo Cavalcanti e Rebeca ao Poço” no blog  www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ 
    Lembramos que o governo de Lorenzo II Medici fora orientado por este seu tio, papa Leão X, de simpatias “popolanas” (termo político partidário florentino) e que se demonstrara cauteloso com a elite florentina.   Leão X tentou no período ainda proteger politicamente o nosso ramo Cavalcanti (ramo Cavalleschi) e mesmo atrair o ramo dos Mainardo Cavalcanti (ramo Cavallereschi) para a esfera Medici, com encomendas de seda entre 1512 e 1513, não conseguindo, porém. O ramo dos Mainado e também o nosso, de Giovanni di Lorenzo (ramo Cavalleschi) a partir de 1527 estarão definitivamente comprometidos com o republicanismo dos Capponi. 
   Sobre a tentativa dos Medici atraírem os Mainardo, Sicca, Cinzia M. – artigo “Pawns of international finance and politics: Florentine scultors at the court of Henry VIII", Renaissance Studies, vol. 20, no. 1, 2006, pg.12, nota 41. Sobre a aproximação de Giovanni di Lorenzo às forças anti-medici, ver nosso artigo “Giovanni di Lorenzo Cavalcanti e Rebeca ao Poço” em  www.rosasampaiotorres.blogspot.com/
(5) Os Capponi eram família não tão antiga ou tradicional, mas politicamente muito atuantes em Florença desde a derrota dos “magnati”, no século XIV. Ricos, ligados à produção de seda, haviam já participado como liderança do governo republicano radical ou teleológico de Savanarola e do período final da República de 1527/30, atuando com os Cavalcanti, os Strozzi e outras famílias anti-medici.  Ver mais sobre a atuação política dos Capponi, Strozzi, Cavalcanti e outras famílias de Florença, Torres, Rosa Sampaio – artigo "Médici X Cavalcanti” no 4shared e artigo “Conspiração Pucci & Cavalcanti e 2ª parte “Conspiração Pucci & Rodolfi” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ 
    Vários jovens Capponi participarão, poucos anos depois, também da Conspiração Pucci & Ridolfi de 1575, por fim especialmente caçados pelos Medici por toda a Europa. Ver mais bibliografia na nota 6 e ainda referencias a caçada dos Capponi na nota 15.
(6) Torres, Rosa Sampaio - artigo “Conspiração Pucci & Cavalcanti”, 2ª parte “Conspiração Pucci & Rodolfi” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ 
(7) O envolvimento posterior de Giovanni di Lorenzo Cavalcanti, pai de Filippo Cavalcanti, no episódio da Segunda Republica Florentina de 1527-30 é comentada em pelo menos dois artigos de Torres, Rosa Sampaio – “Giovanni di Lorenzo Cavalcanti e seus filhos...” e “Giovanni di Lorenzo e Rebeca ao Poço”, ambos publicados no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ tendo como fonte especialmente Sicca, Cinzia M. – Artigo “Consumption and trade of art beetween Italy and England in the half of the sixteenth century: the London house of the Bardi and Cavalcanti company” in Renaissance Studies 16, no 2, 2002.
     Já o envolvimento político do nosso patriarca Filippo Cavalcanti contra os Medici em Florença é continuamente referido pela tradição oral da família, em especial referendada pelo respeitado historiador Evaldo Cabral de Mello no artigo já referido “O mito de Veneza no Brasil”, publicado no jornal “Folha de São Paulo”, 1 de julho 2001, repetido e editado em seu livro, Um imenso Portugal, Ed. 34, 2002, pg.156, cap. “O Mito de Veneza”. Citado na nota 2.
       Esta informação familiar ainda hoje é transmitida oral e literariamente, pelo menos, por dois ramos familiares descendentes da família Cavalcanti de Albuquerque no Brasil: o dos Cavalcanti de Gusmão e o dos Cavalcanti Bittencourt. O assunto é aprofundado em Torres, Rosa Sampaio – artigo “Filippo di Giovanni Cavalcanti” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ 
(8) Torres, Rosa Sampaio - artigo “Conspiração Pucci & Cavalcanti”, 2ª parte “Conspiração Pucci & Rodolfi”, com todas as fontes no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ e       também Torres, Rosa Sampaio – artigo “Filippo di Giovanni Cavalcanti”, no mesmo blog. Ainda o ensaio “Notas Biográficas sobre Bartolomeu Cavalcanti” neste blog. 
      Bartolomeo Cavalcanti seria um conspirador muito experiente. Desde 1527 atuava não só militarmente, mas também conspirava contra os Medici e pela Republica. Mas em 1559, Bartolomeu não teria conseguido livrar Stolto Cavalcanti de tarefa arriscada e da consequente punição. Stolto era tido como seu sobrinho, mas na verdade um parente colateral do ramo "Ciampolo”. Stolto, jovem (17 de junho 1526 - janeiro 1560) e sofisticado filho do banqueiro Tomazzo Cavalcanti, certamente ficou muito indignado pelo assassinato por amigos dos Medici de seu adolescente irmão, de dezessete ou dezoito anos (11 de abril de 1537-1555) e por este motivo teria aceitado a incumbência deveras arriscada que parece o deteve, até o fim, em Florença. Mais sobre Stolto e sua trágica família na bibliografia citada. 
 (9) Republicanos exilados das mais variadas tendências republicanas, indiferentemente radicais ou “ottimatis", segundo os profundos estudos do historiador moderno Paolo Simoncelli (opus cit.) não se haviam ainda dado por vencidos na luta contra os Médici prepotentes após a queda da Republica de Florença em 1530 e a derrota militar humilhante de Montemurlo, em 1537. 
       Desseseis anos mais tarde, a luta pela defesa da República de Siena (1554/55), cidade vizinha ameaçada por Cosme I de Medici, ainda agregará um grupo poderoso de banqueiros florentinos, mobilizados sobretudo por Bindo Altoviti, líder dos banqueiros de Florença em Roma, que havia perdido seu filho Cássio lutando em Montemurlo.     Desta empresa participavam jovens de inúmeras famílias e de várias facções republicanas exiladas, os chamados “fuoriusciti”, lutando unidos contra as tropas armadas medicéias e imperiais. Contavam os rebelados, agora, com o auxílio aberto do rei Henrique II da França, marido de Catarina Médici, esta em luta especial contra seus parentes já no contexto mais amplo da guerra francesa contra as forças do Sacro Império. 
       Neste episódio da defesa da cercada, e por fim dilacerada Siena, a família Cavalcanti se colocou pelo muito experiente Bartolomeo di Mainardo Cavalcanti em função dirigente. Nesta ocasião seu jovem filho, Giovanni, foi tomado por Cosimo como refém. Também os filhos do falecido e poderoso banqueiro Filipe Strozzi, que se suicidara na prisão, atuaram como comandantes militares e foram, nestes episódios, muito penalizados.
       Castelos e fortalezas da região tornados ruínas pelos bombardeios. Siena teve sua população devastada. Neste contexto, após a derrota da batalha de Marciano (ou Scannagallo), agosto de 1554, centenas de famílias sienenses resistentes se juntou às forças do comandante ferido, Piero Strozzi, que curava seus ferimentos na fortaleza de Montalcino.
       Resumo de Torres, Rosa Sampaio – artigo “Médici X Cavalcanti” publicado na mídia eletrônica, em http/;//4shared.com/ , e onde todos os detalhes e fontes são referidos.
(10) A queda da “Republica de Siena Retirada para Montalcino” e a descoberta da “Conspiracão Pucci & Cavalcanti” no mês de outubro do mesmo ano de 1559, constituem, a nosso ver, os episódios culminantes da resistência florentina aos Médici dominantes na Toscana, episódios ocorridos num mesmo momento histórico. 
      O assunto é analisado e contextualizado em Torres, Rosa Sampaio – artigo “Médici X Cavalcanti” http/;//4shared.com/ , com todas as fontes referidas. Consultar também Benci, Spinello - Historia de Montpulciano, [Massi], 1882, pg.134.
    A “Republica popular de Siena Retirada para Montalcino”, região identificada na Toscana é hoje uma herança cultural, tombada pela Unesco em 2007.
(11) Torres, Rosa Sampaio – artigo “Médici X Cavalcanti” http/;//4shared.com/ , com fontes.
(12) Michel Eyquem de Montaigne (1533-1592) foi famoso escritor, crítico e humanista francês.    
      Seu pai foi o nobre Pierre Eyquem que havia lutado chefiando tropas francesas, juntamente com republicanos exilados florentinos, contra as forças do Sacro Império Germânico e os Medici na batalha de Marciano em 1554 - espírito tido como metódico e aberto, neste sentido orientando a educação do filho. 
     O jovem Michel fez estudos de Direito. Retirou-se para o seu castelo quando tinha 34 anos, com a intenção de se dedicar ao estudo e à reflexão. Levou nove anos para redigir os dois primeiros livros dos “Essais”, obra em que tenta fazer uma analise das instituições, de opiniões e costumes sociais. Depois de viajar pela Europa durante dois anos (1580-1581) fez o relato desta viagem no livro “Journal de Voyage”. Ao regressar ao seu castelo, continuou ainda a escrever os “Essais”. Seu livro “Journal de Voyage” somente será publicado em 1774. Em sua obra, muito pessoal e intimista, Montaigne chegou a criticar a devastação indígena pelos espanhóis e o próprio fim da Republica popular de Montalcino, para ele de grande simbolismo, inclusive familiar. Espírito despido de misticismo, céptico, mas humanista.  
(13) Simoncelli, Paolo - Fuoriuscitismo Republicano 1530-54, FrancoAngeli, 2006, “Introducione”, pg.10 e 11. O autor cita Montaigne, (M. de - Giornale di Viaggio, vol. III, Firenze, Parenti, II, pg.141, 142) e relata sua visita sentimental à Montalcino em julho de 1581, fortaleza que ele afirmava “capital d´una Reppublica in agonia, eroica e estinta...”
   John Adams, presidente americano, adiante desenvolveu um estudo teórico sobre a Republica Florentina de 1527-1530, buscando adaptar o modelo de “pequenas republicas” ao sistema representativo.  Ver The Works of John Adams, Second President of the United States: with a Life of the Author, Notes and Illustrations, by his Grandson Charles Francis Adams (Boston: Little, Brown and Co., 1856). 10 volumes. Vol. 5. Chapter Third, Florence.    
     Consultado ainda Furtado, José Pinto- O manto de Penélope; historia, mito e memória da Inconfidência, Cia. Da Letras, 2002, com resumida abordagem teórica sobre o conceito de Republica a partir do romano Cícero (103-460), pensador que articulou “consenso político” e “utilidade comum”. 
     Especificamente sobre os ordenamentos das Republicas de Florença, neste período, já existem trabalhos brasileiros na área jurídica.   
      Os episódios da Toscana, neste período, são melhor contextualizados em Torres, Rosa Sampaio – artigo “Médici X Cavalcanti” http/;//4shared.com/  
(14) A península italiana no século XVI estava engajada na luta pela manutenção de suas tradicionais Republica-Estado: Genova, Florença, Lucca e Siena.  No ducado de Milão a questão republicana também se havia colocado no curto período da “Republica Áurea Ambrosiana”, 1447-1450, e por ocasião do atentado republicano de Girolamo Olgiati, em 1476, de consequências dramáticas.  
   A República de Veneza, entretanto, constituiu experiência duradoura no modelo “ottimati”, em vigor do ano aproximado de 697 até ser tomada por Bonaparte em 1797.
     Outras Republicas existiram fora da península italiana, e aí o processo se deu, contrariamente, em sucesso crescente: a “Confederação Helvética” (séc. XIII até hoje) a “Republica de Ragusa”, em Dubrovinik na Croácia (1358-1808), a “Republica das Duas Nações” - Polônia e Lituânia (1569-1791), as “Províncias Unidas dos Paises Baixos” (1579-1795, a partir desta data “Bávara” e posteriormente socialista/comunista de 1918 até maio 1919). A experiência republicana inglesa foi curta (1641-1652). A 1ª Republica francesa de 1792 a 1804, e a americana de 1789 dura até hoje.
    Ver mais alguns comentários sobre as variadas experiências Republicanas no século XVII em Evaldo Cabral de Mello - A Fronda dos Mazombos, Cia. das Letras, 1995, pg. 280.
     Ainda artigo específico de Torres, Rosa Sampaio - “Os ideais Republicanos na Peninsula Italiana” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ 
(15) Torres, Rosa Sampaio - artigo “Conspiração Pucci & Cavalcanti” e 2ª parte “Conspiração Pucci & Rodolfi” no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ e, da mesma autora, o artigo “Medici X Cavalcanti”, publicado em http/;//4shared.com/
     Para exemplificar a duríssima punição e perseguição dos Medici, perseguição que nosso Filippo pode ter temido, relembramos nestes artigos citados acima o acontecido com os jovens da família Capponi que participaram da Conspiração descoberta em 1575, duramente caçados pelos Medici por toda a Europa.   
   Em nossa própria pesquisa, constatamos a morte de Piero Capponi quando alcançado, fato que é confirmado em Diaz, Furio – Il Gran ducado di Toscana; I Medici, UTIET, 1976, pg. 232 e Murphy, Caroline P. – Isabelle de Medici, Murder of a Medici Princess, Oxford Press, 2008, pg. 292. A morte de Piero é também referida por Carta, Paolo – La Republique em Exil, XVXVI siècles. ENS, 2002, pg.115, citando ainda Piero Capponi como exemplo dos republicanos florentinos protegidos pela corte francesa de Catarina de Medici. Sachetti, Franco e Capponi, Gino – La Villa di Marignolle, Universidade de Michigan, Marcílio, 2000, pg. 30, também comentam as boas relações de Piero Capponi com a Rainha inglesa e seu sepultamento em Londres. O historiador Boutier, Jean – artigo «  Trois conjurations Italiennes: Florence (1575), Parme (1611), Gênes (1628) » in « Melange de l´Ecole française de Rome ». Italie et Méditerranée, T. 108, n 1, 1996, acompanha notavelmente a caçada dos Capponi, mas não registra a morte de Piero.
       A data do falecimento de Uguccione Capponi - 1597 - alcançado pelos sicários Medici fora do Estado é apenas referida por di Ricci, Giuliano, Cronaca (1532-1606) vol. 17, Ricciardi, 1972, pg. 212. Esta data coincide com a data de sua morte indicada na tabela de Boutier, Jean – artigo citado, sem outras indicações.
        Ruperto (Roberto) di Piero Capponi teria sido, na França, ainda bem mais tarde, em 1605, assassinado, quando já havia sido perdoado.  No poder já estava o grão–duque Ferdinando, filho de Cosimo I (Boutier, Jean – artigo citado, pág. 337, sua fonte P. Litta e Passerini).
(16) Ideias republicanas ou meros comentários seriam perigosas de ser explicitadas por Filippo di Giovanni Cavalcanti no Brasil Colonial dos primeiros tempos, não só por se constituirem um atentado contra a Coroa portuguesa que o abrigava, ainda pelo perigo da perseguição dos tirânicos Medici, tema que Filippo certamente desejaria evitar em publico. Sabe-se que os Medici, ainda no fim do século XVI, mantinham elementos que os informavam sobre as colônias e os florentinos que aí habitavam, conforme também constata Sérgio Buarque de Holanda em seu artigo “Os projetos de colonização e comércio Toscanos no Brasil ao tempo do grão Duque Fernando I (1587-1609)” - Revista de História n. 71, 1967, pg.103, pdf.
(17) Torres, Rosa Sampaio Torres – “Família Cavalcanti de Albuquerque”, livreto, 1ª edição Gráfica Visual, 2001, 2ª edição revista em 2011 para uso familiar, mas aberto para consultas. Também em especial artigo da mesma autora, em finalização, “Antonio Cavalcanti, o da Guerra Holandesa”, aberto a pesquisas.  
(18) A veracidade deste episódio é discutida por Evaldo Cabral de Mello em A Fronda dos Mazombos citada, pg. 277-8, autor que por fim referenda sua ocorrência, pois repetido em várias crônistas de época.    Bernardo Vieira de Mello, naquela ocasião, estaria além do mais envolvido no assassinato de sua nora Ana de Faria e Souza, ainda prevendo um possível ataque dos franceses de Du Clerc que então ocupavam o Rio de Janeiro. 
     Bernardo Vieira de Mello era senhor de engenho e se havia tornado experiente militar e sertanista, ambicioso do cargo de governador, pronto para uma resistência militar prolongada à metrópole. Com o fracasso dos rebeldes foi detido, acusado de sedição.  Enviado para a prisão do Limoeiro, em Lisboa, com seu filho e outros revoltosos, inclusive os Bezerra Cavalcanti, sob ferros. Morreu aparentemente de causas naturais na cadeia. 
   Sobre Vieira de Mello, consultar Cabral de Mello Evaldo - O Nome e o Sangue, Cia. das Letras, S.P., 1989, pgs. 44, 45, 46, ainda A Fronda do Mazombo, citada, índice onomástico e seu envolvimento na morte de sua nora, pag. 307. Vieira de Mello é citado por Frei Caneca como enviado para Portugal (ver Cabral de Mello, Evaldo – Frei Joaquim do amor Divino Caneca, editora 34, 2001, pg. 283). Mais informações sobre a “Guerra dos Mascates” na nota 20.
(19) Os conflitos e episódios cotidianos, inclusive episódios de caracter republicano durante a chamada “Guerra dos Mascates” são apresentados de maneira romanceada, mas dentro do espírito da época, por Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque em “O Magnificat, Memórias Diacrônicas de Dona Isabel Cavalcanti”, Tempo Brasileiro, RJ, Fundação Roberto Freire, 1990, pg. 106 e seguintes. 
    Os sentimentos e os conflitos internos dos Cavalcanti de Albuquerque, por sua psicologia muito especial, síntese de pelo menos quatro culturas e etnias, são expostos pela romancista com rara sensibilidade, ainda que a cronologia apresentada não esteja muito correta, cronologia até hoje historiograficamente mal apresentada.    
    A existência de conflitos na família Cavalcanti de Albuquerque são inteiramente confirmados por pesquisas históricas realizadas por Rosa Sampaio Torres, pesquisas realizadas paralelamente ao trabalho ficcional de Ana Cristina, e especialmente focado no principal ramo varonil dos Cavalcanti de Albuquerque, descendente de Antonio e seu filho Felipe, estabelecido em Alagoas no fim século XVIII no engenho Castanha Grande. Esta pesquisa é apresentada com detalhes no artigo “O Ramo dos Cavalcanti de Albuquerque do engenho Castanha Grande”, próximo no blog. Também sobre a longeva caracteristica “sdegnosa” dos Cavalcanti, Torres - Rosa Sampaio, artigo “Os Sdegnosos Cavalcanti” já publicado no blog www.rosasampaiotorres.blogspot.com/
(20) Guerra dos Mascates – Conflitos políticos e militares ocorridos em Pernambuco entre 1709-1711, do qual participaram senhores de engenho de Olinda contra autoridades e comerciantes portugueses, mascates do Recife. Tem como vencedores os comerciantes de Recife que vêm assim como predominantes seus capitais mercantis, nos moldes necessários ao sistema colonial. Durante a revolta da “nobreza da terra”, a sedição contra a Coroa se faz patente. 
   Nestes episódios os Cavalcanti de Albuquerque têm papel liderante. O ramo dos Bezerra Cavalcanti - descendentes de Antonio, filho do florentino, pela neta Isabel, o bisneto Antonio, “o da Guerra”, e a trineta Leonarda casada com Cosme Bezerra Monteiro - foram no conflito com os Mascates, em 1710, tidos conscientemente como os mais insubmissos frente às autoridades portuguesas que assim os privilegiaram em suas punições. O coronel Leonardo Bezerra Cavalcanti, sabidamente, tinha desprezo pelos reinóis e foi enviado para a prisão do Limoeiro, em Lisboa, depois degredado para as Índias com Leão Falcão d´Eça.  Dois de seus filhos seguem o destino trágico do pai. Igualmente seus dois irmãos, o capitão Cosme Bezerra Monteiro e Manuel Cavalcanti Bezerra, todos embarcados “carregados de ferros”, enviados para Portugal com outros rebeldes e iguais destinos trágicos. 
   Em “A Fronda dos Mazombos”, no capítulo VI, “A Sedição da Nobreza”, Evaldo Cabral de Mello discute a ocorrência de reunião rebelde na Câmara de Olinda onde teria sido votada uma proposta republicana de governo, proposta vencida, escolhido o bispo para o governo. Cabral de Mello sugere ainda nesta ocasião  uma aliança dos Bezerra Cavalcanti com elementos republicanos como André Dias de Figueiredo e José Tavares de Holanda.  A destruição do pelourinho por rebelados em trajes indígenas, durante esta fronda em 1710, tem caráter simbólico e demonstra seu nítido pendor nativista, contra a prepotência colonial. 
     E os Bezerra Cavalcanti serão até mesmo, no século seguinte, homenageados por frei Caneca, o republicanista por excelência já da confederação do Equador (ver Cabral de Mello, Evaldo – Frei Joaquim do amor Divino Caneca, editora 34, 2001, pg. 283).
    Também resumo, correções e citações da participação dos Cavalcanti no episódio, Torres, Rosa Sampaio Torres – “Família Cavalcanti de Albuquerque”, livreto, 1ª edição Gráfica Visual, 2001, ainda restrito ao uso familiar. Da mesma autora artigo específico sobre os Bezerra Cavalcanti e a “Guerra dos Mascates”, ainda em elaboração, mas aberto a pesquisas. 
     Cavalcanti de Albuquerque, Maria Cristina - opus cit., pg.108-137, apresenta com detalhes romanceados a “Guerra dos Mascates” e o clã dos Bezerra Cavalcanti.
(21) Em “A Fronda dos Mazombos”, no capítulo VI, “A Sedição da Nobreza”, especialmente pgs. 280-281, Evaldo Cabral de Mello sugere a aliança dos Bezerra Cavalcanti com André Dias de Figueiredo e José Tavares de Holanda - este formado em Direito, falando idioma estrangeiro, e tendo provavelmente estudado na Europa, com influências de ideias europeias republicanas (e iluministas?) durante o episódio da Guerra dos Mascates. Na nota 108 o autor cita como fonte as informações colhidas em crônica de época do dr. Manoel dos Santos, “[Narração histórica das] Calamidades de Pernambuco”, editada por J. A Gonçalves de Melo, Recife, 1986, pg.72.            
    Sobre os Bezerra Cavalcanti e a “Guerra dos Mascates” ver ainda nota 20 acima e Torres, Rosa Sampaio Torres – “Família Cavalcanti de Albuquerque”, livreto, 1ª edição Gráfica Visual - 2001, para uso familiar.
(22) Conspiração Suassuna – conspiração descoberta em 1801, precedida pela Inconfidência Mineira (1789). Está incluída no ciclo de episódios organizados contra a dominação colonial no Brasil e América Espanhola, já inspirado pelos ideais iluministas e liberais de Revolução Francesa de 1789. A “Conspiração Suassuna” teria preconizado, até mesmo, a tomada de Napoleão como protetor. Seus líderes foram Francisco Xavier Cavalcanti de Albuquerque e seus filhos Francisco de Paula e Holanda Cavalcanti de Albuquerque e José Francisco de Paula e Holanda Cavalcanti de Albuquerque, donos do engenho “Suassuna” em Penambuco. Francisco de Paula foi preso nesta ocasião. A devassa da conspiração, entretanto, ocorreu em sigilo tendo em vista a importância social dos implicados. Tinha como inspiração as idéias do “Aerópago de Itambé”, sociedade secreta que não admitia a participação de europeus em seus quadros, fechada após a descoberta da “Conspiração Suassuna”. Os ideais de Itambé ressurgem na própria “Academia dos Suassunas” que continuou funcionando no engenho do mesmo nome, acabando a família envolvida novamente na Revolução de 1817, em Pernambuco.
(23) Na Revolução Pernambucana de 1817, o ramo dos Suassuna e outros de Cavalcanti de Albuquerque e Albuquerque Maranhão tiveram atuação de destaque. Os Albuquerque Maranhão no episódio tiveram vários de seus membros decapitados.     
     Evaldo Cabral de Mello (artigo “Entre a República e a Monarquia” – Folha de S. Paulo 4/8/2002) lembra a atuação do famoso “Cel. Suassuna” (Capitão-mor Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque, 1760-1827), novamente preso neste episódio de 1817: “O Suassuna teve contato com o movimento concordando com o líder Antonio Carlos Ribeiro de Andrade que homens de qualidade estariam ‘arruinados se não juntassem os seus esforços para destruir uma cabala de malfeitores [....] A Ribeiro de Andrade [...] Suassuna teria prometido aliciar apoios no sul da capitania, ficando a cargo do Andrada contatar um setor da tropa de linha. Enviado pela junta para barrar a marcha do exército realista da Bahia, Suassuna procurou entabular negociações com o general Congominho, que comandava o exército realista, contando seguramente com a adesão de oficiais maçons de tendências constitucionalistas que compunham o estado-maior”. Ainda sobre as atividades do cel. Suassuna em 1817 e seus contatos com bonapartistas, Cahú, Sylvio de Mello – A revolução Nativista Pernambucana de 1817. Biblioteca do Exercito, 1951, pg. 16, 92 e 136. O assunto também referido em Grieco, Donatello - Napoleão e o Brasil, Bibliex, 1955 citado em Torres, Rosa Sampaio, “Família Cavalcanti de Albuquerque”, livreto, 1ª edição gráfica Visual 2001, 2ª edição revista 2011, para uso familiar.
(24) Os “Suassunas", membros do ramo de Cavalcanti de Albuquerque do engenho do mesmo nome, por sua rebeldia nativista estiveram, portanto, no cerne do processo de Independência. Não é por outro motivo que os quatro filhos do chamado “cel. Suassuna” preso por sua participação em 1817 tornaram-se figuras de relevo, reconhecidas por D. Pedro I para interlocução e administração do novo Império e em seguida nobilitados. Entre estes irmãos, Antonio Francisco de Paula Holanda Cavalcanti de Albuquerque - o Visconde de Albuquerque - se destaca o por sua importantíssima atuação parlamentar e ministerial.  
(25) Deste quarteto o irmão mais velho, Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque, depois Visconde de Suassuna, fez parte ainda da Junta dos Matutos em 1823, episódio de governança pernambucana que antecede à Confederação do Equador, junto com um Albuquerque Maranhão.  Outro membro da família Bezerra Cavalcanti, Leonardo Bezerra Cavalcanti que foi deputado, é ainda referido também como participante da Confederação do Equador, já no ano seguinte.
(26) Torres, Rosa Sampaio – artigo “O Ramo dos Cavalcanti de Albuquerque do engenho Castanha Grande”, próximo a ser publicado no blog  www.rosasampaiotorres.blogspot.com/ O ramo do Castanha Grande é referido em Torres, Rosa Sampaio Torres “Família Cavalcanti de Albuquerque”, livreto, 1ª edição Gráfica Visual 2001, para uso familiar, mas aberto a pesquisas.